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Litígios envolvendo Startups = Competência das Câmaras Reservadas de Direito Empresarial

No âmbito do Direito Empresarial, a correta definição da competência recursal é um ponto central para a adequada tramitação dos litígios. O recente acórdão proferido pela 26ª Câmara de Direito Privado do TJ/SP na Apelação Cível nº 1080406-84.2020.8.26.0100 exemplifica bem essa dinâmica, ao tratar de questão atinente a startup.

 

O caso em comento envolvia um contrato de “mútuo conversível em participação societária”, instrumento tipicamente utilizado no financiamento de startups e previsto na Lei Complementar nº 182/2021 (Marco Legal das Startups). A empresa investidora (autora) alegava que a gestão da sociedade investida foi conduzida de forma temerária, com descumprimento de obrigações contratuais e a prática de atos contrários à boa administração, dentro da clássica perspectiva que os investidores alegam: remuneração de pro labore aos sócios de forma desproporcional aos resultados da empresa.

 

A sentença de primeiro grau declarou o vencimento antecipado do contrato, determinando a devolução dos valores investidos e a incidência de multa. A startup, por sua vez, interpôs apelação, argumentando desde dificuldades financeiras para arcar com as custas até questões de mérito, como a ausência de gestão irregular e o suposto descumprimento de obrigações também pela investidora.

 

No entanto, o recurso foi direcionado à Câmara com competência cível, e não empresarial. Logo, pelo fato de o cerne da demanda  tratar de matéria relacionada à administração societária e à interpretação de normas do Direito Empresarial (especialmente os artigos 966 a 1.195 do Código Civil e a Lei nº 6.404/1976), a competência recursal seria das Câmaras Reservadas de Direito Empresarial. Com base no artigo 6º, I, da Resolução TJSP nº 623/2013,  que é razoavelmente subjetivo e oblíquo diga-se de passagem, determinou-se a redistribuição do recurso para uma das Câmaras REservadas de Direito Empresarial.

 

O caso reafirma como é importante contar com um escritório jurídico que de fato saiba todos os meandros quando se trata de litígios empresariais envolvendo startup, pois nesse caso o erro no protocolo do recurso poderia ter custado mais caro à parte litigante que se equivocou quanto à competência. Nunca é demais contar com advocacia especializada quando se trata de uma área tão dinâmica quanto a do Direito das Startups.

 

O acórdão reafirma a importância do correto enquadramento das questões empresariais envolvendo startups dentro do sistema recursal no Tribunal Bandeirante, garantindo que casos que envolvem regras específicas de governança corporativa e investimentos em inovação sejam analisados por magistrados especializados na matéria. Mais do que uma questão processual, a referida solução garante salutar coerência decisória, especialização dos julgadores e a previsibilidade jurídica nesse setor tão dinâmico e importante da economia.

 

Então fica a dica, se o caso envolve questões empresarias de startup, a competência recursal em São Paulo pertence a uma das Câmaras Reservadas à essa matéria.

 

Dados do processo interpretado já formatados para citação:

 

(TJSP;  Apelação Cível 1080406-84.2020.8.26.0100; Relator (a): Morais Pucci; Órgão Julgador: 26ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível – 24ª Vara Cível; Data do Julgamento: 09/05/2024; Data de Registro: 09/05/2024)

 

Ementa do processo interpretado:

 

Apelação cível. Ação declaratória cumulada com cobrança. Sentença de procedência da ação principal e de improcedência da reconvenção. Apelo da ré-reconvinte. Contrato de mútuo conversível em participação societária. Modalidade de investimento em inovação, notadamente em startup, prevista na Lei Complementar nº 182/2021 (Marco Legal das Startups). Alegações de má gestão da empresa investida e violação de cláusulas contratuais, que fundamentariam o vencimento antecipado dos aportes realizados na startup requerida e a incidência de multa. Demanda fundada no Livro II, Parte Especial do Código Civil (Direito de Empresa – arts. 966 a 1.195) e na Lei nº 6.404/1976 (Sociedades Anônimas). Causa de pedir especialmente relacionada à administração societária, segundo regras dispostas entre os artigos 1.010 e 1.021 do CC e entre os artigos 153 e 157 da Lei nº 6.404/1976. Competência recursal de uma das C. Câmaras Reservadas de Direito Empresarial deste E. Tribunal. Art. 6º, I, da Resolução nº 623/2013. Precedentes. Recurso não conhecido, com determinação de redistribuição a uma das C. Câmaras Reservadas de Direito Empresarial.

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Paulo Schwartzman
Advogado titular da Schwartzman Advogados (banca de advocacia voltada para startups) é graduado em Direito pela USP. Mestre em Estudos Brasileiros pela USP. Pós-graduado em Direito Civil pela LFG (Anhanguera/UNIDERP), em Direito Constitucional com ênfase em Direitos Fundamentais e em Direitos Humanos pela Faculdade CERS, em Direito, Tecnologia e Inovação com ênfase em Direito Processual, Negociação e Arbitragem pelo Instituto New Law (Grupo Uniftec). Foi assessor de magistrado no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo de 2016 até 2024. . Colunista no Jornal Jurid e articulista no Migalhas. . Empreendedor social, é fundador e executivo C-level de diversas startups voltadas à melhoria do mundo.

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