O Exemplo Que Forja Destinos
Para Claudiovir Delfino — cuja vida, sem jamais alardear, faz-se farol, régua e roteiro.
Por Lúcio Delfino*
Há vidas que, por seu simples curso, orientam. Não porque se proponham a isso, mas precisamente por não se proporem. A grandeza de um verdadeiro modelo não reside nos discursos persuasivos, mas na silenciosa autoridade — aquela que se impõe sem força, persuade sem palavras e ensina sem nunca pretender ensinar. O futuro de um homem costuma ser o prolongamento de um exemplo que viu e decidiu seguir. Quando esse exemplo é o correto, transforma destinos.
Nasci filho daquele que viria a ser meu maior mestre. Foi uma dádiva cuja real dimensão só compreendi mais tarde. Claudiovir Delfino não é apenas o melhor advogado que conheci: é, no mais profundo sentido, o ser humano mais completo que pude observar de perto. Capaz de resolver problemas complexos com uma clareza desconcertante, sua mente une pragmatismo e elegância com rara harmonia. Parece pensar por linhas invisíveis, conduzindo sempre ao essencial, sem ornamentos ou vaidades. Seu ego, plenamente domado, revela a serenidade de quem já superou a necessidade de provar algo a alguém.
Profícuo, estudioso, pontual, incansável, sincero e cortês no convívio — meu pai não apenas exerce a advocacia; ele a honra. É diligente como poucos e, após cinquenta e cinco anos de profissão, segue trabalhando com a mesma tenacidade que o movia décadas atrás. Sua personalidade cativa. Sua postura em audiência é uma arte: não apenas domínio técnico, mas uma forma elevada de presença, escuta e entrega.
Louis Lavelle ensina que “o eu não é um ser dado, mas um ser que não para de se dar a si mesmo”. O eu, prossegue, se realiza por escolha: “escolher um modelo já é começar a realizar-se” (LAVELLE, Louis. A consciência de si. Tradução de Lara Christina de Malimpensa. São Paulo: É Realizações, 2014). Meu pai escolheu os seus — alguns visíveis, outros invisíveis —, mas também se forjou à imagem da própria experiência: da luta, do sofrimento, da renúncia, da verdade que soube sustentar nos momentos em que seria mais fácil ceder. Assim, tornou-se referência para tantos, e muitos colhem frutos por terem seguido seus passos.
Nem todos aqueles a quem a oportunidade bateu à porta a vivenciaram da mesma forma. Alguns optaram por caminhos distintos — seja por decisão pessoal, por acasos ou pela perseguição de sonhos. A vida, com seu tempo e seus mistérios, mostrará a cada um se encontrou abrigo ao longo do percurso. Entretanto, permanece o que realmente importa: a gratidão pelo privilégio de ter aprendido com um Mestre autêntico, cuja presença tornou a caminhada mais segura, mais reta e, sobretudo, mais altiva.
Figuras como ele iluminam sem ostentar, corrigem sem humilhar, exigem sem prepotência. São horizontes, porque apontam a direção do que podemos ser. São linha de prumo, porque garantem retidão; bússola, porque sinalizam; âncora, porque sustentam.
Ao vê-lo hoje, com vigor juvenil, semeando virtudes, percebo o quanto devo à graça de tê-lo como pai e mentor. E é com essa compreensão que encerro esta homenagem, recordando a lição de Sêneca, nas Cartas a Lucílio:
“Que a nossa alma […] tenha um modelo a quem venere e cuja autoridade torne mais nobre mesmo o seu mais íntimo recesso. […] Feliz o homem capaz de ter por alguém tanto respeito que a simples lembrança do modelo basta para lhe dar ordem e harmonia espiritual! Quem for capaz de ter por alguém um tal respeito, em breve inspirará, por seu turno, respeito idêntico. […] Escolha alguém cuja vida, cujas palavras, cujo rosto, enfim, espelho da própria alma, sejam do teu agrado. Contempla-o sempre, ou como teu vigilante, ou como teu modelo. Temos necessidade, repito, de alguém por cujo caráter procuremos afinar o nosso: riscos tortos só se corrigem com a régua!” (SÊNECA, Lúcio Aneu. Cartas a Lucílio. Tradução de Carlos Alberto Nunes. Belém: Editora da Universidade Federal do Pará (UFPA), 2020. v. 1).
*Advogado. Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Diretor da Revista Brasileira de Direito Processual (RBDPro). Ex-presidente da Associação Brasileira de Direito Processual (ABDPro).