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A impossibilidade de ação anulatória de sentença arbitral estrangeira.

No sistema de reconhecimento de sentenças estrangeiras adotado no Brasil, somente é possível anular tal laudo na origem, isto é, no país sede da arbitragem. Apenas aquele judiciário é o competente para processar e julgar demanda anulatória de sentença arbitral conforme se denota do art. 38, VI, da LArb.

Com efeito, não se cogita a possibilidade de manejo de ação anulatória de sentença arbitral estrangeira homologada com base art. 33 da LArb, notadamente com a indicação de suposta incidência de algum dos dispositivos do rol taxativo do art. 32 da mesma lei.

O controle judicial da sentença arbitral nacional é regulado pelos arts. 32 e 33 da LArb, enquanto o controle da sentença arbitral estrangeira encontra amparo nos arts. 34 a 39. Significa dizer que “o legislador tratou, em capítulos diferentes, a sentença arbitral nacional e estrangeira, sendo que essa última não poderá ser submetida à ação de nulidade prevista no art. 32, que diz respeito exclusivamente a sentença arbitral nacional”[1].

Ao admitir um outro caminho de pretensão anulatória bilateralizar-se-ia a via processual de invalidação de sentenças arbitrais, tornando inócuo o controle meramente delibatório de sentenças forasteiras. Tal possibilidade retiraria a estabilidade do próprio processo homologatório, ampliando indevidamente as possibilidades de protelar a implementação de efeitos da arbitragem ocorrida no estrangeiro[2].

A quem considere ainda que a inviabilidade de demanda anulatória de sentença estrangeira homologada também decorre da aplicação análoga ao tratamento dado as decisões proferidas pelo tribunais estatais de modo se não é possível pretender anular uma sentença judicial estrangeira perante o Poder Judiciário brasileiro, também não é possível anular uma sentença arbitral estrangeira, tampouco utilizar como fundamento os argumentos do art. 32 da Lei de Arbitragem[3], mais ainda: a tentativa de anular uma sentença estrangeira não homologada representa nítida hipótese de falta de interesse de agir (CPC, art. 485, VII).

A doutrina arbitralista[4] e processualista[5] brasileiras concordam que anulação a decisão arbitral estrangeira apenas pode ser feita no país onde foi proferida ou no país cuja lei as partes optaram como a lex arbitri, cabendo a parte interessada unicamente opor-se na ação de homologação, como matéria de defesa[6]. De fato, essa modalidade controle judicial caberá a Corte do local da prolação da sentença[7].

Selma Lemes, em parecer que analisava a possibilidade de anulação de laudo arbitral estrangeiro originário da CCI que tinha como sede da arbitragem a cidade de Nova Iorque pelo Judiciário brasileiro manifestou-se no sentido de que apenas a jurisdição norte-americana seria “competente para avaliar e exercer controle sobre a sentença arbitral ditada em seu território”[8].

Já no caso CAOA vs Renaut julgado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em que foi ajuizada ação anulatória de sentença arbitral estrangeira com pedido de antecipação de tutela requerendo a suspenção do procedimento arbitral, se buscava a nulidade da sentença arbitral parcial já proferida e permissão para apresentar, perante o juízo estatal, as suas pretensões numa clara tentativa de escapar dos efeitos da convenção de arbitragem e do próprio procedimento arbitral que tramitava no estrangeiro.

O ponto que nos interessa é o fato da decisão do tribunal paulista ter considerado a sentença arbitral parcial proferida pela CCI com sede em Nova Iorque como sentença estrangeira o que atrairia , na época, a competência do STF para o exercício do juízo delibação. O precedente em questão foi importantíssimo e, nas palavras de João Bosco Lee, “delimita de maneira precisa que a sentença arbitral proferida no exterior não pode ser analisada pelos tribunais nacionais e sem a devida homologação, a sentença arbitral estrangeira não existe perante o ordenamento jurídico brasileiro”[9].

É possível verificar que a própria denegação do pleito homologatório faz as vezes da anulatória, já que sem a validação feita pelo STJ, a decisão arbitral estrangeira não teria qualquer efeito no Brasil, aliás, enquanto não homologada sequer é considerada sentença existente, servindo, quando muito, como um elemento de prova já que o seu conteúdo decisório não enseja qualquer alteração das relações jurídicas entabuladas em território nacional[10].

 

Notas e Referências:

[1] Cf. ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa. Inviabilidade da demanda de anulação da sentença arbitral estrangeira ajuizada perante o Poder Judiciário brasileiro. In: ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa (Org.). Pareceres: Processo e Direito Material . São Paulo: Ed. RT, 2015. v. 1, p. 167.

[2] ABBUD, p. 267.

[3] VINCENZI, Brunela Vieira de. Fase pós-arbitragem: problemas posteriores ao processo de homologação de sentença estrangeira e o comportamento temerário das partes. Revista de Arbitragem e Mediação. n. 26. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.

[4] Vide notas 32, 33 e 34

[5] Cf. ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa. Inviabilidade da demanda de anulação da sentença arbitral estrangeira ajuizada perante o Poder Judiciário brasileiro. In: ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa (Org.). Pareceres: Processo e Direito Material . São Paulo: Ed. RT, 2015. v. 1, p. 145 e ss.

[6] MAGALHAES, José Carlos. Sentença arbitral estrangeira: incompetência da Justiça brasileira para anulação : competência exclusiva do STF para apreciação da validade em homologação. Revista de Mediação e Arbitragem n. 1. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, p.142.

[7] MARTINS, Pedro Batista. Sentença arbitral estrangeira: incompetência da Justiça brasileira para anulação : competência exclusiva do STF para apreciação da validade em homologação. Revista de Mediação e Arbitragem n. 1. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, p.159.

[8] LEMES, Selma. Sentença arbitral estrangeira: incompetência da Justiça brasileira para anulação : competência exclusiva do STF para apreciação da validade em homologação. Revista de Mediação e Arbitragem n. 1. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, p.191.

[9] LEE, João Bosco. O Caso CAOA v. Renault. Revista Brasileira de Arbitragem, n.3. Curitiba: IOB, 2004, p. 136 e ss..

[10] SILVA NETO, Francisco de Barros e. Breves considerações sobre o reconhecimento de sentenças estrangeiras. Revista de Processo, v. 228. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 84.

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Alberto Maia
Doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Mestre em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). Professor de Arbitragem e de Processo Civil da Unicap. Advogado e Árbitro. Membro da Lista de árbitros da Câmara de Arbitragem Especializada CAMES e da CMAA ACIF. Fundador do Grupo Marco Maciel de Mediação e Arbitragem (GMMA) da Unicap. Colaborador do Grupo de Estudos em Direito Administrativo CNPq/UNICAP. Membro da Comissão de Conciliação, Mediação e Arbitragem da OAB/PE, da Associação Brasileira de Direito Processual -ABDPro e da Associação Brasileira dos Estudantes de Arbitragem. ABEArb e da Iniciativa de Novos Arbitralistas da INOVARB-AMCHAM. Membro do Comitê de Jovens Arbitralistas do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CJA – CBMA).

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