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Honorários Contratuais nas Arbitragens

A precificação de honorários em arbitragens pode ser uma tarefa ainda mais desafiadora do que o usual. Fatores como a variabilidade dos casos em termos de complexidade, duração e escopo, ou mesmo as grandes diferenças procedimentais encontradas, a depender do árbitro ou Tribunal Arbitral nomeado pelas partes, são complicadores comuns que desafiam os causídicos da área a buscarem uma sintonia fina para precificação de seus serviços.

 

Em se tratando de arbitragens, estimar o tempo e os recursos necessários para resolver um caso específico é a primeira tarefa especialmente complexa, principalmente na fase inicial do procedimento, quando todos os detalhes ainda não são conhecidos.

 

As arbitragens também podem envolver questões técnicas que exijam a necessidade de contratação de consultores, especialistas ou peritos, o que pode aumentar ainda mais os custos, tornando a estimativa inicial menos precisa.

 

Além de tudo, os processos de arbitragem podem ser imprevisíveis em termos de duração e desdobramentos. Mudanças no curso do processo, como a introdução de novas provas ou testemunhas, podem aumentar o tempo e os esforços necessários, impactando a estimativa de honorários profissionais.

 

Do ponto de vista do cliente, sobretudo, as expectativas sempre são as mais variadas e inconstantes, o que complica ainda mais o equilíbrio desses anseios com a necessidade de se praticar um valor justo pelo serviço a ser prestado. A transparência e a comunicação clara são essenciais, mas ainda assim pode ser difícil alinhar expectativas.

 

Não se pode ignorar, por igual, a concorrência no (soberano) Mercado. Mesmo mais reduzido e, em tese, sofisticado, o mercado da arbitragem pode ser competitivo, com diferentes profissionais ou firmas oferecendo serviços a valores variados. Pressões competitivas podem influenciar a precificação, exigindo que se encontre um equilíbrio entre ser competitivo e garantir a sustentabilidade financeira.

 

Em alguns casos, as associações de arbitragem ou ordens de advogados podem ter diretrizes ou tabelas de referência para a cobrança de honorários. Embora essas diretrizes possam ajudar, elas também podem limitar a flexibilidade na precificação, especialmente para casos que não se encaixam perfeitamente nos padrões.

 

Isso tudo ainda é permeado pelos próprios custos e despesas do procedimento arbitral. Além dos honorários advocatícios, há custos administrativos e operacionais associados à condução de uma arbitragem (e.g., aluguel de espaço para audiências, taxas de registro, despesas com viagens), assim como os honorários dos próprios árbitros e as custas do Tribunal. Tudo isso, por evidente, é somado na mesma balança pelo cliente.

 

Nesse sentido, algumas premissas e alguns aspectos podem ajudar, tais como o estabelecimento de “marcos” de cobrança no curso do processo, ou seja, hipóteses que vão se aperfeiçoar (ou não) de acordo com o caso específico, cabendo (ou não) a cobrança do valor estipulado a depender do desenrolar do procedimento.

 

Bons exemplos nesse sentido: a concessão (ou rejeição) de pedido antecipatório ou incidental; o recebimento ou rejeição do pedido de instauração do procedimento arbitral; o início de eventual perícia; a realização da primeira (segunda, etc) audiência; o decurso de determinado período de tempo após o início do procedimento; o êxito na sentença; a necessidade de interposição de recurso e/ou medida judicial; a necessidade de resposta a recurso e/ou medida judicial pela outra parte; a necessidade de deflagrar a execução da sentença arbitral e/ou a necessidade de atuar judicialmente em sede de execução.

 

Não se pode perder de vista que muitas arbitragens acabam sendo apenas uma “etapa”, restando ainda longa prestação de serviços perante o Poder Judiciário, tendo em vista o alto número de ações anulatórias que são promovidas após o fim dos procedimentos arbitrais, bem como as providências de ordem executiva, igualmente frequentes e, não raro, arrastadas.

 

Nesses casos, convém ressalvar nos contratos de honorários tais possibilidades, não apenas para dar transparência e informação ao cliente, mas também para evitar a interpretação de que o objeto contratual contemple eventual atuação judicial, seja no curso do procedimento arbitral, seja após a sua conclusão, o que para o cliente nem sempre é de fácil ou natural depreensão.

 

Além disso, as ações judiciais estarão submetidas às regras especiais da Lei nº 9.307/96, bem como às regras processuais do Código de Processo Civil, o que leva à fixação, muitas vezes, de honorários de sucumbência, aspecto que também deve ser levado em consideração pelo causídico que, por vezes, pode decidir por ingressar no caso com a perspectiva de acrescer aos honorários contratuais a verba sucumbencial, questão esta que depende também de uma boa análise prévia das chances de êxito do seu respectivo cliente.

 

Não se olvide que pode existir sim hipóteses em que há condenação em honorários sucumbenciais na própria sentença arbitral.

 

São os casos em que a convenção arbitral estipula tal regra de forma explícita, ou ainda, mesmo sem previsão específica – e com ainda certa recalcitrância jurisprudencial – quando o Código de Processo Civil é utilizado pelas partes como regra base de regência procedimental:

 

“(…) Percebe-se que o art. 32, IV, da Lei 9.307/1996, tido pelos insurgentes como violado, estabelece a nulidade da sentença arbitral se for proferida fora dos limites da convenção de arbitragem.

 

Nesse tocante, em que pese a alegação da parte autora, nota-se que, conforme expressamente asseverado na decisão objurgada, ao arbitrar os honorários de sucumbência, o Juízo arbitral partiu de interpretação das regras sucumbenciais previstas no Código de Processo Civil de 2015.

 

Destarte, forçoso reconhecer que não foram ultrapassados os limites firmados na convenção de arbitragem, motivo pelo qual o acórdão proferido pelo Tribunal a quo não merece reparo.

 

Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial.” (Superior Tribunal de Justiça, Acórdão da Terceira Turma nos autos do Recurso Especial nº 2066262/SP, julgado em 2 de maio de 2023; Relator: Ministro Marco Aurélio Bellizze).

 

Da mesma forma, quando da impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, sua rejeição também leva à fixação de honorários sucumbenciais, dado o caráter contencioso da medida. Nesse sentido:

 

“RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA ARBITRAL. PEDIDO DE NULIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CABIMENTO. RECURSO PROVIDO.

    1. Segundo precedente da Corte Especial, é cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios quando o incidente processual for capaz de extinguir ou alterar substancialmente o próprio processo principal.

    1. A invalidação da sentença arbitral pode ser reconhecida em ação autônoma de nulidade (art. 33, § 1º, da Lei n. 9.307/1996) ou pleiteada por intermédio de impugnação ao cumprimento da sentença (art. 33, § 3º, da Lei n. 9.307/1996), quando estiver sendo executada judicialmente.

2.1. A impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, em que se busca a nulidade da sentença, possui potencial de encerrar ou modificar significativamente o processo de execução judicial.

2.2. Nesse aspecto, são cabíveis honorários advocatícios pela rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, na hipótese em que se pleiteia anulação da sentença com fundamento nos arts. 26 e 32 da Lei n. 9.307/1996.

    1. Recurso especial a que se dá provimento para condenar a parte executada ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais.” (Superior Tribunal de Justiça, Acórdão da Quarta Turma nos autos do Recurso Especial nº 2.102.676/SP, julgado em 21 de novembro de 2023; Relator: Ministro Antonio Carlos Ferreira).

 

Em suma, precificar honorários em arbitragens exige uma combinação de análise detalhada, transparência, flexibilidade e comunicação eficaz com os clientes para garantir que os honorários reflitam de maneira justa o trabalho a ser realizado e as expectativas de todas as partes envolvidas.

 

São bons predicados para nortear essa desafiadora missão e alcançar o primeiro êxito, que é o da contratação: uma análise inicial detalhada (o que, querendo ou não, lhe custará tempo, por vezes não remunerado); o uso de contratos claros e bem detalhados, que expliquem como os honorários serão calculados e as circunstâncias que podem levar a ajustes, tudo de forma absolutamente transparente e informativa; flexibilidade, sempre que possível, garantindo que se possa estar preparado para ajustar os honorários conforme o caso evoluir, e que ambas as partes compreendam e concordem com as mudanças; o estabelecimento de reservas, mediante cláusulas contingenciais, que possam cobrir eventos processuais que nem sempre ocorrem, fases que podem ou não ser alcançadas, dentre outras medidas, inclusive judiciais, ou mesmo imprevistos.

 

Uma última palavra, como uma espécie de “regra geral”: pense no custo do trabalho em primeiro lugar, e com peso maior, sempre.

 

Isso se deve a um único motivo: a pessoa do cliente pode levar o advogado a cobrar errado, para mais ou para menos, ao passo que quando ele foca no trabalho que terá, e no quanto o seu trabalho, tempo e expertise valem, a análise se torna mais objetiva. Assim, aumentam as chances de não arrependimento no curso daquela ação / contrato, pois o preço foi estabelecido da forma mais justa possível para a pessoa do advogado enquanto profissional, equilibrado ao “tamanho” e ao valor do seu trabalho, e não à pessoa do cliente (e suas possibilidades ou impossibilidades financeiras).

 

Embora seja difícil, uma recomendação adicional é excluir dessa variável a sua própria necessidade financeira do profissional, pois quando tal necessidade está alta, a tendência é cobrar abaixo do preço do serviço, enquanto que quando a necessidade está baixa, a tendência é cobrar mais pelo mesmo trabalho, pois se pode, em tese, assumir mais ou menos o risco do cliente não aceitar a proposta, o que, por vezes, causará arrependimentos, seja pela assunção de um serviço a valores abaixo do que ele vale (quando a necessidade financeira estiver alta), seja pela perda do cliente que não aceitar honorários acima do valor médio esperado.

 

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Guilherme Macedo
Advogado com 15 anos de experiência de foro e arbitragens. Formado em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Bacharel em Administração pela Academia da Força Aérea / Universidade da Cidade. Árbitro do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem - CBMA. Sócio Fundador do Escritório Guilherme Macedo Advogados. Anteriormente foi Sócio Sênior do Escritório H. B. Cavalcanti e Mazzillo Advogados. Foi também aviador da Força Aérea Brasileira. Fala português, inglês, espanhol e italiano.

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