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Discussões iniciais acerca das Demandas Predatórias: aspectos práticos e teóricos

Por Gabriel Henrique Santos Pereira da Silva e

José Durval de Oliveira Queiroz dos Santos

 

INTRODUÇÃO

Inicialmente, vale ressaltar a grande prejudicialidade das demandas predatórias, que, por muitas vezes, são confundidas com demandas massificadas. Entretanto, as demandas massificadas não configuram infrações éticas, apenas são demandas legítimas ajuizadas em massa, sem maiores prejuízos. De certo modo, nem toda demanda massificada é predatória, mas praticamente toda demanda predatória é massificada.

Por outro lado, as demandas predatórias são extremamente nocivas à sociedade, seja por superlotar o poder judiciário com demandas sem fundamento, seja por causar efeitos práticos irreversíveis nas vidas das pessoas. Trata-se de prática de abuso do direito de ação.

Nesse viés, o magistrado Leonardo Costa, em palestra realizada na Conferência Estadual da Advocacia, ocorrida em Petrolina, no ano de 2023, relatou que em suas comarcas houve 3.388 ações judiciais que foram indeferidas pelo fato de serem predatórias. Na mesma palestra, o magistrado relatou o caso de um idoso que veio a óbito pela demora ao ser apreciada a liminar de saúde em seu caso. Essa demora se deu ao fato de a comarca estar superlotada de ações idênticas recheadas de teses genéricas advindas do mesmo advogado, sendo um exemplo claro de como essa prática é nociva não só ao poder judiciário, mas também à sociedade.

Nas decisões, o magistrado levou em consideração diversos indícios de ajuizamento irregular de processos em massa na comarca e de má-fé processual, através de petições padronizadas e sem documentação suficiente; argumentos nada verossímeis, artificiais e recheados de teses genéricas; ilegalidade na captação de clientela; utilização indevida dos serviços judiciais; abuso da gratuidade da justiça e do direito de litigar; irregularidades na confecção de procuração e demais documentos; inexistência de litígio real entre as partes e vestígios de apropriação indébita de valores pelo advogado.

É natural questionarmos se a atitude do magistrado configurou Ativismo Judicial ou Poder Geral de Cautela, pois essa é uma das principais polêmicas que envolvem as discussões legais sobre demandas predatórias. Contudo, demonstraremos que é mais importante desenvolver mecanismos realmente efetivos de combate às demandas predatórias do que se prender a discussões sobre Ativismo Judicial ou Poder Geral de Cautela, com foco na Segurança Jurídica.

Dessa forma, comprovado os danos irreparáveis das demandas predatórias, como o Legislativo e o Judiciário recebem esses casos? O Ordenamento Jurídico brasileiro está preparado para lidar com essas demandas? De antemão, esclarecemos que, para que essa situação seja completamente superada e sanada, é indispensável que a análise deva partir tanto da visão do micro (o advogado infrator perante à OAB) quanto do macro (o acompanhamento que essas demandas devem ter frente ao Judiciário).

Adianta-se que, para lidar com advogados predadores que atualizam seus meios ilegais de atuação constantemente, precisaremos de uma medida que trará segurança jurídica (acréscimo no CPC) e de uma medida que tenha a flexibilidade de se atualizar com a mesma constância dos predadores (por meio do CNJ). Ainda, abordaremos uma solução subsidiária: o julgamento coletivo das demandas supostamente predatórias. Não obstante a isso, será demonstrado o papel da OAB no combate a esta problemática.

Geralmente os advogados agressores, agem de maneira dolosa, em que assediam cidadãos em situação de vulnerabilidade (etária, intelectual e física) para ingressar com ações e receber os benefícios financeiros quando a sentença é favorável. Esses cidadãos muitas vezes não possuem qualquer tipo de saber jurídico, sendo essa a principal vantagem que os advogados abusam, pois utilizam de sua boa imagem, que passa credibilidade, para induzir as vítimas a assinarem documento de procuração.

 

1 O ATUAL CONTEXTO DO CPC FRENTE ÀS DEMANDAS PREDATÓRIAS

É necessário expor que este tema é bastante abrangente, pois toca questões como o ativismo do Poder Judiciário e as limitações do poder geral de cautela dos juízes. Isto porque, quando se analisa a questão da litigância predatória, gera-se uma espécie de paradoxo entre o poder geral de cautela e o ativismo judicial.

Este paradoxo ocorre da seguinte forma: uma vez que o juiz indefere uma petição inicial utilizando o argumento de que desconfia da presença de um caráter predatório naquela demanda, estaria este cometendo um ato de ativismo judicial (indo além do que lhe compete) ou de poder geral de cautela (apenas exercendo sua função legal de organizar o procedimento)? Considerando que o rol do artigo 330 do CPC é taxativo, bem como não está incluso o caso das demandas predatórias, entendemos que a atitude do magistrado que indefere a petição inicial, alegando desconfiar que se trate de demanda predatória, pode ser considerada ativista.

 

Art. 330. A petição inicial será indeferida quando:

I – for inepta;

II  – a parte for manifestamente ilegítima;

III – o autor carecer de interesse processual;

IV – não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321 .

§ 1º Considera-se inepta a petição inicial quando:

I – lhe faltar pedido ou causa de pedir;

II – o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido   genérico;

III – da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;

IV  – contiver pedidos incompatíveis entre si.

 

A grande questão é que, a partir do momento que o juiz indefere uma petição por desconfiar que se trate de uma demanda predatória, ao passo em que o rol do artigo 330 (que traz os casos de indeferimento da inicial) é taxativo, o magistrado estará sujeito a tomar para si a função de legislar, a qual deve ser do Poder Legislativo, tipicamente. Há, porém, a corrente que defende que tal indeferimento configura Poder Geral de Cautela, sob o argumento de que o CPC confere liberdade para os juízes conduzirem o feito, determinando a adoção de diligências e providências que entender necessárias ao julgamento da demanda [Vital, Danilo; 2023]. Assim, segue, para melhor entendimento, o julgamento do tema 1198, o qual trata de um explícito caso de conflito entre Ativismo Judicial e Poder Geral de Cautela:

 

CORTE ESPECIAL. Situação: Afetado (última atualização em 17/02/2024)

O Superior Tribunal de Justiça afetou, em 09/05/2023, o Recurso Especial nº 2.021.665/MS, como paradigma da controvérsia repetitiva descrita no Tema 1198 – STJ. Situação do tema: Afetado. Questão submetida a julgamento: Possibilidade de o juiz, vislumbrando a ocorrência de litigância predatória, exigir que a parte autora emende a petição inicial com apresentação de documentos capazes de lastrear minimamente as pretensões deduzidas em juízo, como procuração atualizada, declaração de pobreza e de residência, cópias do contrato e dos extratos bancários. Anotações NUGEPNAC: Tema em IRDR 16/TJMS (IRDR 0801887-54.2021.8.12.0029/50000) – REsp em IRDR.

 

A verdade é que, mesmo que o CPC garanta um Poder Geral de Cautela aos juízes, dependerá de juiz para juiz, de maneira subjetiva, entender pela aplicação ou não do poder geral de cautela diante de demandas que desconfiem ser predatórias, visto que tal instituto jurídico foi recepcionado pela jurisprudência brasileira de maneira desvirtuada, sendo, em muitos casos, um nome “charmoso” para os magistrados desrespeitarem as leis.

Põe-se em xeque o grande dilema trazido neste tópico: o juiz deve, sim, agir de maneira que, acima de tudo, proteja as leis (exercendo um Poder Geral de Cautela, quando de maneira correta) e, consequentemente, a sociedade. Contudo, o rol do artigo 330 do CPC é taxativo e, a partir do momento que não existe uma norma seca que garanta o indeferimento das demandas predatórias, há uma brecha para que alguns juízes entendam que o indeferimento da inicial supostamente predatória configure Ativismo Judicial, da mesma forma que outros juízes entenderão que é mero exercício do Poder Geral de Cautela. Há uma inegável insegurança jurídica no atual contexto.

Contudo, mais importante do que definir se é Ativismo Judicial ou Poder Geral de Cautela é definir meios que tragam segurança jurídica ao combate às demandas predatórias.

Após uma breve análise acerca da configuração de ativismo judicial ou de poder geral de cautela, a partir de agora serão levantados questionamentos e soluções práticas acerca do papel da OAB no combate às demandas predatórias.

 

  1. QUAL O PAPEL DA OAB DIANTE DA OFENSA E PERIGO DAS DEMANDAS PREDATÓRIAS?

Diante da realidade enfrentada pela advocacia brasileira desde o surgimento das inteligências artificiais e disseminação das demandas predatórias, surge a necessidade de combater tais práticas de maneira material, buscando penalizar os profissionais responsáveis.

O ofício de advogado, como qualquer profissão, requer seriedade e competência no desempenho da função. Entretanto, o que a torna única é o caráter pessoal e baixa margem de erro dos atos dos advogados, isto é, uma peça mal escrita tem total capacidade de decidir os próximos 15 anos do réu, assim como, uma sustentação oral despreparada pode impactar no voto dos julgadores. Está em cheque, ao fim e ao cabo, o bem da vida que a parte deseja proteger/perseguir ao procurar um advogado. O caráter pessoal da advocacia é o que embeleza a rotina, lidar com pessoas reais com problemas reais requer um profissional preparado para saber superar os mais diversos empecilhos, e com a chegada das demandas predatórias, percebe-se que essa característica está sendo muitas vezes banalizada.

Vejamos o que garante o Estatuto da OAB sobre infrações disciplinares:

CAPÍTULO IX

Das Infrações e Sanções Disciplinares

Art. 34. Constitui infração disciplinar

III – Valer-se de agenciador de causas, mediante participação nos honorários a receber;

IV – Angariar ou captar causas, com ou sem a intervenção de terceiros;

 

Entretanto, pela gravidade da prática irregular da advocacia e dos inúmeros danos que podem ser causados, nós acreditamos que as demandas predatórias deveriam ser interpretadas como inadequadas ao requisito da idoneidade moral para inscrição na OAB. Vejamos:

 

CAPÍTULO III Da Inscrição

Art.8º Para inscrição como advogado é necessário:

§ 3º A inidoneidade moral, suscitada por qualquer pessoa, deve ser declarada mediante decisão que obtenha no mínimo dois terços dos votos de todos os membros do conselho competente, em procedimento que observe os termos do processo disciplinar.

 

Conforme visto, o Capítulo III aborda os requisitos para que o advogado tenha a inscrição na OAB, porém, no Capítulo IX, que trata das infrações e sanções disciplinares no art 34, o inciso XXVII apresenta uma hipótese de penalizar os advogados responsáveis pela prática inidônea.

 

CAPÍTULO IX

Das Infrações e Sanções Disciplinares

Art. 34. Constitui infração disciplinar

XXVII – tornar-se moralmente inidôneo para o exercício da advocacia;

 

Toda essa manobra argumentativa é necessária devido aos impactos que a banalização da advocacia enfrenta devido à disseminação das demandas predatórias. Acreditamos que a solução para tal questão requer uma análise mais rebuscada da própria lei, com base no exposto acerca dos requisitos apresentados no art. 8º, § 3º, entende-se que as demandas predatórias vão de encontro à idoneidade moral, o que automaticamente justifica a sanção apresentada no art. 34, inciso XXVII, e, por se constituir infração ao Estatuto da Advocacia apresentado no Capítulo IX, entendemos que a penalização cabível aos profissionais que agem de maneira irregular, deva ser o cancelamento da inscrição na OAB, de acordo com o art. 11 inciso II, utilizando como base o art. 38. Vejamos:

 

Art. 11. Cancela-se a inscrição do profissional que:

II – sofrer penalidade de exclusão;

Art. 38. A exclusão é aplicável nos casos de:

I – aplicação, por três vezes, de suspensão;

II – infrações definidas nos incisos XXVI a XXVIII do art. 34

Parágrafo único. Para a aplicação da sanção disciplinar de exclusão, é necessária a manifestação favorável de dois terços dos membros do Conselho Seccional competente.

 

            Então, tem-se que diante do contexto social e tecnológico enfrentado pelo Brasil atualmente, urge a necessidade da solução cabível ser mais rígida como forma de frear a propagação das demandas predatórias.

No âmbito das medidas preventivas, A doutrina majoritária entende que a aplicação da suspensão preventiva é cabível no combate das práticas predatórias. Conforme visto anteriormente, o exercício ilegal da advocacia desonra toda uma classe responsável por lutar pelo direito alheio. Dessa forma, como forma de frear tais práticas, urge a necessidade de punir os responsáveis. Portanto, de acordo com o artigo 70 §3° do EAOAB, a adequação da suspensão preventiva é cabível no âmbito de um PAD.

Sob tal perspectiva, para que haja a suspensão preventiva é necessário que a conduta do advogado ocasione repercussão geral, prejudicando a classe da advocacia. A importância da adequação desse artigo aos casos de demandas predatórias é que tal abuso do direito de ação ocasiona danos irreparáveis à sociedade como um todo. Não se pode, em verdade, haver uma acomodação frente às demandas predatórias, sendo essa uma problemática de inevitável repercussão geral.

No âmbito do procedimento do Tribunal de Ética (TED), o advogado acusado de ajuizar demandas predatórias, em que pese tenha a oportunidade de exercer um efetivo contraditório, nada impede que, demonstrada a fumaça do bom direito e o perigo da demora, seja aplicada suspensão preventiva da inscrição na OAB. Os julgadores do TED deverão analisar diversos elementos do caso concreto, como a concomitância de diversas infrações éticas contra o advogado.

Nesse sentido, garante Paulo Lôbo: “a concomitância de várias infrações com julgamentos ainda não concluídos pode caracterizar conduta incompatível com a advocacia fazendo-se incidir o inciso XXV, do art. 34, do EAOAB”. Além disso, sabe-se que o advogado punido 3 (três) vezes por suspensão é excluído dos quadros da OAB, por força do art. 38, I, do EAOAB. Por isso é tão importante a análise dos antecedentes do advogado acusado.

Para além disso, em uma análise jurisprudencial, é importante ressaltar a importância de um devido processo legal, com respeito ao contraditório e à ampla defesa nos processos disciplinares. Por exemplo, a jurisprudência do Recurso nº 49.0000.2021.008749-9/SCA-STU trata da revisão de uma decisão que instaurou um processo disciplinar de suspensão preventiva contra uma advogada. O Conselho Federal da OAB concluiu que a decisão original foi inadequada devido à falta de fundamentação e ausência de razoabilidade. Especificamente, a decisão de suspensão preventiva foi considerada desproporcional à infração disciplinar em questão e não forneceu uma justificativa clara para a medida adotada. Assim, o recurso foi provido para anular a decisão e arquivar o processo como instaurado indevidamente, não sendo configurada a prática de demanda predatória [Recurso n. 49.0000.2021.008749-9/SCA-STU; Relatora: Conselheira Federal Ezelaide Viegas da Costa Almeida (AM). EMENTA N. 072/2022/SCA-STU.; Artigo 75, caput, do Estatuto da Advocacia e da OAB; 9 de agosto de 2022].

Então, nesta primeira abordagem, o foco foi direcionado ao advogado predatório, enquanto, no próximo tópico, o foco será a demanda predatória.

 

2.1      SOLUÇÕES PRÁTICAS PARA AS DEMANDAS PREDATÓRIAS.

Diante deste panorama, nos dedicaremos a abordar soluções práticas para conter os danos, de forma realista, destas demandas que tanto prejudicam a sociedade.

Discutiremos a adoção de dois caminhos centrais no combate às demandas predatórias. O primeiro caminho seria uma alteração/acréscimo no rol do artigo 330 do CPC combinado com constantes resoluções do CNJ que atualizem – de maneira constante – os critérios para configuração das demandas predatórias, enquanto o segundo caminho seria a adoção da prática de julgamento coletivo para resolução das demandas predatórias.

2.2 AS DEMANDAS PREDATÓRIAS JUSTIFICARIAM UMA MUDANÇA NO ARTIGO 330 DO CPC? E O CNJ, COMO ATUARÁ?

           Explicitamente, existe uma brecha no artigo 330 do CPC – a qual é a aproveitada por patronos de má-fé para buscarem lucros e benefícios às custas da representação de seus clientes (ou supostos clientes). Brecha tal que, como no caso trazido na Conferência Estadual da Advocacia Pernambucana, traz danos irreparáveis à sociedade, como foi o caso do idoso citado na introdução.

Tem-se como primeira solução prática, respeitando a perfeita repartição dos três poderes, que o poder legislativo adicione ao rol do artigo 330 do CPC um inciso que garanta o indeferimento das demandas predatórias. Em paralelo a isso, de maneira constante (no mesmo ritmo em que se atualizam os meios e artifícios fraudulentos de tornar uma demanda predatória), o CNJ deverá se atualizar por meio de Resoluções, com critérios objetivos do que é de fato uma demanda predatória, devendo as peças que tiverem esse caráter predatório, serem indeferidas. Esse critério deve ser extremamente objetivo e realista, pois nos moldes que ocorrem hoje em dia, há uma abertura para magistrados julgarem subjetivamente, de acordo com as suas próprias definições morais do conceito de justiça, o que é ou o que deixa de ser uma litigância predatória, o que é ou deixa de ser Poder Geral de Cautela, o que é um explícito desrespeito à segurança jurídica.

A justificativa central da alteração do 330 do CPC é a segurança jurídica. Como dito, uma falta de previsão legal e de uma definição objetiva dos requisitos de configuração de demandas predatórias por parte do CNJ – que, em que pese não tenha força normativa, tem o que é necessário para o presente combate: a capacidade de se atualizar de maneira mais simples do que o CPC -, como ocorre hoje em dia, cria um cenário em que juízes julgam se uma demanda é ou não predatória de acordo com as suas próprias noções de justiça, que são subjetivas.

2.3 O JULGAMENTO COLETIVO COMO SOLUÇÃO ÀS DEMANDAS PREDATÓRIAS?

Esse questionamento surge da reflexão: é correto que demandas predatórias sejam julgadas de maneira separada?

Atualmente, em um contexto em que uma demanda predatória não necessariamente deve ser indeferida (em uma interpretação do rol taxativo do rol do artigo 330 do CPC), parece plausível um determinado “caminho” ao julgamento das demandas predatórias.

Primeiramente, ao desconfiar que se trate de demanda predatória, o magistrado pode, ao invés de prontamente determinar a inépcia da inicial, e antes de dirigir a demanda ao Tribunal de ética da OAB, seguir as orientações previstas pelas Notas Técnicas de seu Tribunal: por exemplo, pode determinar a oitiva das partes (respeitando a Razoável Duração do Processo) e, eventualmente, pedir que as partes juntem documentos legíveis e atualizados. Seria como um filtro antes de fazer a remessa dos autos à OAB. Em verdade, o que, de fato, é nocivo é o indeferimento automático apenas por desconfiar que a demanda é predatória, pois uma possibilidade não é uma certeza.

Caso mesmo após este procedimento inicial a questão ainda não tenha sido resolvida, nada impede que as Varas encaminhem tais demandas à OAB. Após o acúmulo de algumas demandas supostamente predatórias, o Tribunal de Ética da OAB julgará disciplinarmente os advogados.

A partir disso, o Poder Judiciário poderia julgar de maneira coletiva tais demandas consideradas predatórias pelo Tribunal de Ética da OAB. E, em outra remessa de julgamento, as demandas consideradas não predatórias pelo Tribunal de Ética. Nesse sentido, defende Lucas Buril:

De fato, é importantíssimo combater a litigância predatória. Seus efeitos danosos são sentidos diretamente pelo Judiciário e impactam na sociedade como um todo. Não se pode tolerar o uso coordenado de ações judiciais aventureiras, predando os escassos recursos do Judiciário, e a única forma de enfrentar esse novo fenômeno é coordenando respostas.

No atual cenário, de fato, este parece ser o caminho mais plausível no combate às demandas predatórias: (1) a identificação (desconfiança) da infração ética e aplicação das Notas Técnicas dos Tribunais acerca do tema; (2) o encaminhamento dos autos ao Tribunal de Ética da OAB; (3) devolução dos autos ao Poder Judiciário, com parecer opinativo do Tribunal de Ética e (4) o julgamento coletivo dos processos.

Ainda, em seu artigo sobre o tema, publicado na Revista de Processo vol. 351/2024, garante Lucas Buril:

Tratando-se de caso repetitivo, é fundamental que medidas para dar racionalidade às demandas repetidas sejam utilizadas. Nesse ponto, em primeiro grau, parece ganhar grande relevo a reunião de Litigância predatória Página 7 ações não conexas para julgamento conjunto (art. 55, § 3º, do CPC (LGL\2015\1656)) e, se isso for inviável ou insuficiente, o largo emprego de técnicas de cooperação judiciária, notadamente a centralização de processos repetitivos (art. 69, § 2º, VI, do CPC (LGL\2015\1656)).20 Esta última medida parece a mais adequada: a centralização de processos repetidos, por ato concertado, permite uma visão mais completa da estratégia do litigante predatório e um arranjo mais eficiente do Judiciário. O uso adequado desses mecanismos permite diminuir os efeitos perniciosos do grande número de processos. O julgamento conjunto viabiliza que um único ato decisório dê fim a centenas ou milhares de processos. Poupa-se, com isso, recursos judiciários que podem ser dedicados a demandas reais.

         Este caminho descrito acima, no atual cenário – em que não há previsão legal objetiva no CPC acerca do indeferimento das demandas predatórias -, parece ser aplicável a estes tipos de demandas. Contudo, apesar de defendermos este segundo caminho no atual cenário, entendemos que a melhor solução, de fato, seja o acréscimo das definições objetivas que configurem demandas predatórias, por meio das Súmulas do CNJ, em paralelo ao acréscimo do inciso “V” ao rol do artigo 330 do CPC. Tal inciso poderia ser acrescido da seguinte forma: “330, CPC, V – for predatória de acordo com as definições do CNJ no momento do ajuizamento.”

  1. REFERÊNCIAS

 

 

 

 

 

 

 

 

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