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Preferências e Privilégios Creditórios

O tema destas linhas aborda o conhecido “concurso de credores” do Código Civil do século passado. Salvo na hipótese de pensão alimentícia (assunto de Direito de Família), não existe prisão por dívida, de modo que o credor precisa atacar o patrimônio do devedor para se satisfazer.

Assim, se uma dívida não for paga no vencimento, o credor se mune de uma pretensão para executar os bens do devedor e receber seu dinheiro. Correto o legislador, pois a ultrapassada prisão do devedor não traria satisfação ao credor, a dívida permaneceria sem pagamento. Então o que o credor precisa é de receber o dinheiro, sob pena de execução dos bens do devedor. E se o devedor não tiver bens? Ao credor só resta lamentar, na brincadeira se diz que é o “jus sperniandi” , direito de ter raiva, conforme arts 391 e 942 do Código Civil – CC.

Mas se o devedor tiver bens, contudo possui mais dívidas do que bens, o que fazer? Ou seja, imagine alguém com um patrimônio de cem mil reais mas que deve a várias pessoas cento e cinquenta mil reais, a quem pagar primeiro ? A solução está nas regras do concurso de credores. Se o devedor tem muitos bens (pode pagar todas as suas dívidas), ou se o insolvente é pobre (não pode honrar nada do seu passivo) , não se aplica o concurso de credores. Mas sempre que o passivo do devedor for superior a seu ativo, é preciso dividir seu bens com os credores.
Esta é a chamada falência da pessoa física, ou insolvência. Prefiro o termo insolvência, pois falência é indicado para as empresas, assunto de Direito Comercial.

Então insolvente é a pessoa física que possui mais dívidas do que bens para satisfazer todas elas, pelo que deverá ser instaurado o concurso de credores com a declaração de insolvência, para a correta divisão dos bens entre os credores (vide art 955 do CC).
O efeito do concurso de credores é o rateio dos bens do devedor entre os credores. Como se dá esse rateio? Se todos os credores forem iguais, ou seja, sem nenhuma vantagem (privilégio ou preferência) entre eles, o rateio é proporcional ao crédito de cada um (vide arts 957 e 962 do CC)

Mas se existem créditos quirografários ( este é o crédito simples, sem qualquer vantagem) ao lado de créditos preferenciais, os preferenciais receberão primeiro. De regra, todo crédito é quirografário, então se Joao me empresta cem reais, este crédito de regra é quirografário. Se Jose bate no meu carro, este crédito também será quirografário.
Que créditos são preferenciais? São aqueles com vantagem concedida pela lei a certos credores para terem prioridade sobre os concorrentes no recebimento do crédito. A ordem de preferência estabelecida pela lei é a seguinte:
1 – créditos alimentícios: salários, créditos trabalhistas, pensão alimentícia, etc. Os empregados e dependentes do devedor insolvente recebem em primeiríssimo lugar.
2 – créditos tributários: satisfeitos os créditos alimentícios, devem ser pagas as dívidas tributárias do insolvente, ou seja, os impostos e taxas devidos pelo insolvente; satisfeito o poder público, sobrando dinheiro, pagam-se os credores do terceiro grupo:
3 – créditos com garantia real, são aqueles créditos com hipoteca, penhor, anticrese e alienação fiduciária. Tais direitos reais de garantia estão vinculadas a uma coisa, são estudados em Direitos Reais (vide art 958 do CC). Observe que os primeiros credores de direito privado estão aqui, pois os credores dos grupos 1 e 2 são de direito público. Destaco que em caso de falência de empresa no Direito Comercial os créditos bancários preferem aos créditos tributários, é uma maneira inteligente da lei de incentivar os bancos a emprestar dinheiro, com a coisa dada em garantia vinculada ao passivo, vide art 83 da lei 11.101/05. E com certeza mais dinheiro na praça é bom para aquecer a economia e gerar emprego; por isso legislador deve proteger o credor.
4 – neste grupo estão os créditos com privilégio especial, são aqueles credores do art. 964 do CC.
5 – em quinto lugar os créditos com privilégio geral, são aqueles credores do art. 965 do CC
6 – finalmente, os créditos quirografários são os últimos (vide art 961 do CC– o crédito “simples” a que se refere este artigo é o crédito quirografário).

Observações importantes: a) os créditos preferenciais com prioridade recebem integralmente antes de outros créditos preferenciais, então só se passa para o grupo seguinte após satisfação do grupo anterior; b) só após satisfação integral dos créditos preferenciais (grupos 1 a 5) é que se faz o rateio proporcional entre os credores quirografários. Digo rateio proporcional porque se os quirografários também receberem na íntegra não haveria necessidade de ter sido instaurado o concurso de credores, o devedor seria solvente. Assim os quirografários sempre recebem parcialmente; c) como já dito a Lei de Falências no. 11.101/05, alterou a ordem para as empresas, então os credores com garantia real recebem com prioridade sobre os créditos tributários em caso de falência de uma empresa, conforme valor da coisa gravada . Mais detalhes em Direito Comercial.

 

Link da obra Curso de Direito Civil – Volume 1:
https://loja.paradoxum.org/produtos/curso-de-direito-civil-volume-1/

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Rafael de Menezes
Professor de direito civil por 25 anos da Unicap (Universidade Católica de Pernambuco) e da Esmape -(Escola de Magistratura/PE). Ex-Promotor de Justiça. Juiz de Direito do TJPE.

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