Aprender a falar com as plantas – Marta Orriols
Paula acredita que tem a rotina controlada: um relacionamento que já dura quinze anos, um trabalho como médica neonatologista, com a responsabilidade da vida nas mãos. Mas essa realidade desaba quando seu companheiro confessa que tem outra mulher e, horas depois, sofre um acidente de maneira trágica e imprevisível. Agora, ela precisa aprender a lidar com o luto, com o rancor, com a inaptidão para novos afetos e com um apartamento repleto de plantas deixadas por alguém que representava o seu laço humano mais íntimo.
O livro traz reflexões sobre um duplo abandono. O luto é apenas uma das dores com as quais Paula precisa aprender a lidar. Além dele, vem o rancor com o choque da descoberta da traição que irá reconfigurar todo o processo de luto que está sendo elaborado. É um livro do jeito que eu particularmente gosto: fluida, um tanto “dura”, mas poética e envolvente.
Paula embarca em jornadas extenuantes no trabalho, com plantões intermináveis, na tentativa de se manter sã e não precisar lidar com a dor da perda. Agarrar-se à vida como resposta contra a sombra da morte.
Por um longo período Paula sustenta para os familiares e amigos a imagem do relacionamento sólido, interrompido apenas pela morte.
Marta Orriols insere no livro um roteiro que parece ser um padrão a ser seguido de acordo com aqueles que observam e acompanham o luto alheio. O interessante é como a protagonista, Paula, busca rechaçar esses lugares comuns, questionando e negando o vazio dos discursos e provando que não há padrão no luto.
Além disso, a autora narra com muita sensibilidade dois temas universais e por vezes, tabus: a traição e o luto. Se, por vezes, estas parecem questões trabalhadas à exaustão, o principal êxito está na maneira como se esquiva do sentimentalismo e dos lugares comuns.
No livro podemos observar capítulos onde a personagem parece conversar consigo mesma e em outros, constrói um diálogo unilateral com o companheiro morto. É justo aqui que residem os momentos mais tocantes da narrativa, ao dizer do afeto e do cotidiano compartilhado. A obra exala maturidade. Orriols tem um domínio muito maduro da narrativa, assim como seus personagens tem uma consciência da própria maturidade de forma sensível e indelével.
Uma das coisas que mais gostei no estilo da autora foi o detalhismo em algumas passagens. É muito potente porque constrói a cena em imagens muito vívidas na mente do leitor, como se ela nos colocasse no mesmo ambiente que os personagens.