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Poder público é obrigado a fornecer medicamentos ainda não incorporados na lista do SUS?

A saúde é um direito de todos e dever do Estado, sendo o único pilar da Seguridade Social ilimitado, de modo que o fornecimento de medicamentos é garantido a quem deles necessitar.

Todo cidadão tem direito ao acesso à medicamentos de alto custo pelo SUS  e desde 2019 a justiça estabeleceu três critérios que devem ser preenchidos de forma cumulativa para que alguém receba um medicamento pelo poder público mesmo que ele não esteja na lista do SUS.

Caso o remédio que você precisa já faça parte da lista do SUS, você tem direito a este medicamento, de modo que União, Estado e Município são obrigados a te fornecer este medicamento independente de ação judicial.

Entretanto, se você precisar de um medicamento de alto custo que não está na lista do SUS e ele for negado pela Secretaria de Saúde do seu Município ou Estado, você precisará requerer judicialmente, bem como cumprir os critérios que serão expostos ao longo deste texto.

Em seu artigo 198, inciso II, a Constituição Federal estabeleceu como uma das diretrizes do SUS o “atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais”.

Já a Lei n. 8.080/1990, que concretizou a criação do SUS, ao tratar do atendimento integral, definiu em seu art. 6º, inciso I, alínea “d” que estão incluídas no campo de atuação do SUS a execução de ações de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica.

Importante mencionar que quando falamos de direito à saúde o princípio da reserva do possível não encontra amparo na Constituição, pois sabendo dos custos da gratuidade da saúde, já impôs aos Entes Federados reservas e transferências constitucionais a fim de amparar os cidadãos neste ponto. Assim, a justificativa orçamentária não pode ser utilizada como impeditivo para o cumprimento do dever inescusável do Estado de garantir a saúde e a vida.

Ademais, o Estado pode ser obrigado, excepcionalmente, a fornecer medicamentos não contemplados na portaria n. 2.982/2009, do Ministério da Saúde (Programa de Medicamentos Excepcionais), desde que comprovada a necessidade do paciente em razão da ineficácia dos medicamentos disponibilizados, indisponibilidade dos medicamentos listados, existência de medicamentos comprovadamente mais eficientes no tratamento da doença que acomete o paciente.

No tema repetitivo 106 do STJ em que a questão submetida a julgamento envolvia a obrigatoriedade do poder público de fornecer medicamentos não incorporados ao SUS foi firmada a tese que determina quais são os requisitos que devem ser atendidos de forma cumulativa para a concessão desses medicamentos. Vejamos abaixo quais são eles.

A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:

i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
iii) existência de registro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência.

O primeiro requisito consiste na demonstração da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento que não está listado no SUS para o tratamento do paciente, por meio de laudo médico circunstanciado e fundamentado, devidamente expedido por médico que acompanha o paciente, assim como da ineficácia dos fármacos fornecidos pelo SUS naquele caso concreto.

O segundo requisito está relacionado à comprovação da hipossuficiência daquele que requer o medicamento. É preciso demonstrar que a compra por conta própria do medicamento comprometeria a sua subsistência ou de seu grupo familiar, sendo incapaz de arcar com os custos da aquisição do medicamento prescrito.

Por fim, o terceiro requisito a ser preenchido é a devida aprovação do medicamento solicitado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA. Esta exigência está prevista no artigo 19-T, inciso II, da Lei n. 8.080/1991.

Ante todo o exposto, podemos concluir que se restringir a obrigatoriedade da inserção na lista do SUS para o fornecimento de medicamentos configura uma burocracia prevista em normas de inferior hierarquia que não tem o poder de prevalecer sobre direitos fundamentais como o direito à vida e à saúde.

Apenas o médico que acompanha o paciente é que pode avaliar o estado de saúde e a necessidade dos remédios indispensáveis para a melhora do quadro clínico, visto que é ele quem possui o conhecimento científico suficiente para propor o melhor caminho.

Portanto, a decisão judicial de fornecimento de determinado medicamento será tomada com base na individualidade de cada caso concreto, levando em consideração a necessidade comprovada por prescrição médica, e não em caráter geral e abstrato.

 

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Mariana Kozan
Pós-graduada em Direito Civil e Processo Civil. Bacharela em Direito pela Unioeste (2017). Capacitada em Planos de Saúde pela Escola de Direito da Saúde. Participante da Oficina de Formação em Biodireito, Bioética e Direitos Humanos da UFU. . Advogada atuante em direito da saúde, em defesa dos usuários do SUS e Planos de Saúde. Conciliadora no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.

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