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Resolução 175 da CVM e algumas mudanças nos fundos de investimento

A Resolução 175 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), cuja vigência – inicialmente prevista para 3 de abril de 2023 –, iniciará somente a partir de 2 de outubro de 2023, revogará instruções anteriores da CVM, em especial a Instrução 555, e concentrará o arcabouço regulatório dos fundos de investimento.

O mercado vem discutindo as principais mudanças trazidas pela regulamentação nova, que, sem dúvida, tem um de seus alicerces na Lei nº 13.874/2019 (Lei da Liberdade Econômica).

Relembre-se, por oportuno, que foi essa lei que inseriu, no Código Civil, o regramento base sobre fundos de investimento (artigos 1.368-C a 1.368-F), o qual não somente define o fundo de investimento como “uma comunhão de recursos, constituído sob a forma de condomínio de natureza especial, destinado à aplicação em ativos financeiros, bens e direitos de qualquer natureza”, mas atribui à CVM, expressamente no Código Civil, a disciplina sobre os fundos; e estabelece regras para limitação de responsabilidade no âmbito dos fundos (artigo 1.368-D).

A CVM, então, editou a Resolução 175, que estabeleceu mudanças relevantes em relação ao regramento anterior.

Uma das principais mudanças está na divisão de tarefas entre o administrador e o gestor. Na regulamentação anterior, o administrador, que era o responsável, por exemplo, por contratar os demais prestadores de serviços (art. 78 da ICVM 555), agora abrirá mão deste protagonismo e dividirá com o gestor essa tarefa. Isso significa não só uma reorganização de atribuições, mas uma realocação de riscos de responsabilização: o gestor, com maior protagonismo, naturalmente terá mais responsabilidades, e, caso não as cumpra, poderá sofrer as consequências.

Nessa linha, caberá ao gestor, a partir da vigência da Resolução 175, em nome do fundo, contratar terceiros para prestarem os seguintes serviços, acaso obrigatórios: (i) intermediação de operações para carteira de ativos; (ii) distribuição de cotas; (iii) consultoria de investimentos; (iv) classificação de risco por agência de classificação de risco de crédito; (v) formador de mercado de classe fechada; e (vi) cogestão da carteira de ativos (artigo 85 da Resolução 175).

Em relação às classes de cotas, o gestor pode contratar outros serviços, que não os acima referidos, em benefício de uma das referidas classes, sendo certo que (i) a contratação não deve ocorrer em nome do fundo, salvo previsão regulamentar ou caso haja aprovação em assembleia; e (ii) caso o prestador de serviço contratado não seja um participante de mercado regulado pela CVM ou o serviço prestado ao fundo não se encontre dentro da esfera de atuação da CVM, o gestor deve fiscalizar as atividades do terceiro contratado relacionadas ao fundo.

Especificamente em relação aos fundos de investimento em direitos creditórios (FIDC), os gestores também estão autorizados a contratar, em nome do fundo, prestadores de serviços de consultoria especializada (que pode englobar a função de agente de cobrança), e de agente de cobrança.

Também em relação aos FIDCs, o gestor será responsável por estruturar o fundo, que consiste no seguinte conjunto de atividades: (i) estabelecer a política de investimento; (ii) estimar a inadimplência da carteira de direitos creditórios e, se for o caso, estabelecer um índice de subordinação; (iii) estimar o prazo médio ponderado da carteira de direitos creditórios; (iv) estabelecer como se darão os fluxos financeiros derivados dos direitos creditórios; e (v) estabelecer hipóteses de liquidação antecipada que devem constar do regulamento.

Ao gestor também competirá, em relação aos direitos e títulos representativos de crédito, a verificação da existência, integridade e titularidade do lastro referente a tais títulos, o que pode ser feito de forma individualizada ou por amostragem, utilizando-se modelo estatístico consistente e passível de verificação.

Outra novidade da Resolução 175, referente aos FIDCs, diz respeito à consolidação da entidade registradora, que – autorizada pelo BACEN, e contratada pelo administrador – prestará o serviço de registro de direitos creditórios (sendo certo que tal entidade não poderá ser parte relacionada ao gestor ou da consultoria especializada). O registro dos direitos creditórios na referida entidade registradora da classe ou a entrega destes ao custodiante ou administrador, conforme o caso, compete ao gestor (a quem também cabe, nos termos da Resolução 175 efetuar a correta formalização dos documentos relativos à cessão dos direitos creditórios).

Apenas pincelamos algumas mudanças que advirão da vigência da Resolução 175. Outras, especialmente a que trata de classes e subclasses de cotas, serão exploradas em outras oportunidades. Sem dúvida, a Resolução 175 reflete uma nova fase para os fundos de investimento no Brasil, o que traz maior segurança jurídica para os investidores, para o mercado em geral e para os investidores estrangeiros.

 

 

 

 

 

 

 

 

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Cássio Lira Braga
Mestre em Ciência Política (UFCG). Pós-graduado em Direito Empresarial (FGV-RJ). Graduado em Direito (UEPB). Professor de Direito Empresarial. Advogado consultivo nas áreas de M&A, Societário, Contratos e Mercado de Capitais no escritório Monteiro de Castro, Setoguti Advogados.

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