POLÍTICA DE DISTRIBUIÇÃO DE DIVIDENDOS: TEORIA DA CLIENTELA E ALGUNS ASPECTOS LEGAIS.
De uma forma geral, toda atividade econômica explorada por um empresário, sendo este o que exerce a “empresa” (atividade econômica organizada mediante a combinação de fatores de produção), tem como um dos principais objetivos a remuneração dos seus sócios (acionistas ou quotistas), mediante o recebimento dos lucros da entidade, de acordo com as respectivas participações no capital social. Ainda que consideremos todos os demais objetivos sociais da empresa, ela sempre deverá, ao final, “premiar” aqueles que nela confiaram, e remunerá-los com a distribuição dos resultados positivos obtidos. Sendo assim, todas as decisões tomadas dentro de uma Companhia devem levar em consideração, dentre outros fatores, o melhor resultado a ser gerado para seus acionistas/quotistas. Por óbvio, não podem ser desconsiderados aspectos da responsabilidade ambiental, social e de governança das Companhias, amplamente discutidos atualmente sob a sigla ESG.
No âmbito dessas decisões, existem aquelas ligadas à política de distribuição de dividendos. Este fator – quantidade e periodicidade nas quais a Companhia remunera seus acionistas – muito influenciará nas escolhas dos investidores: investir em determinada empresa ou se valer de outro tipo de aplicação?
Existem várias teorias que buscam dar embasamento à determinação da política de distribuição de dividendos, dentre as quais se destaca a teoria da clientela. Para tal vertente, as Companhias devem pautar suas decisões de política de distribuição de dividendos com base nos interesses específicos dos acionistas e daqueles que nela investirão. Assim, a depender do perfil do investidor que esteja disposto a aplicar o seu capital na Companhia, esta deverá adotar um comportamento mais ou menos conservador no que diz respeito à distribuição dos seus resultados positivos.
Ainda, esta teoria explica o “efeito clientela”, que nada mais é do que a repercussão dos interesses dos potenciais investidores na escolha da política de dividendos da Companhia. Certamente, este processo de tomada de decisão pela Companhia influenciará no processo de tomada de decisão dos investidores (se aplicam ou não o capital na Companhia) e dos que já são acionistas (se mantêm ou não o capital aplicado na Companhia).
Como contraponto à teoria da clientela, tem-se a teoria da irrelevância dos dividendos, segundo a qual o valor de uma Companhia é medido pela sua capacidade de gerar caixa, e não pelo modo como distribui dividendos. Em tese, as proposições da teoria da irrelevância dos dividendos poderiam até estar completamente corretas.
No entanto, observa-se que o mercado, em regra, não se comporta de tal maneira. Basta verificar na prática de mercado que as Companhias que adotam uma política de dividendos menos conservadora (possuem um índice de payout mais elevado e remuneram os acionistas com uma maior frequência) tendem a atrair mais investidores.
Neste cenário, as Companhias devem, na medida do possível, traçar um perfil que possibilite individualizar o tipo de investidor que está disposto a nelas investirem, a fim de estabelecer as políticas de distribuição de dividendos de acordo com os interesses de seus possíveis acionistas. Alguns investidores preferem ser remunerados de forma menos frequente, com o intuito de se obter um maior ganho de capital no futuro. Ao contrário, outros investidores tendem a direcionar seus investimentos para as Companhias que remunerem seus acionistas de forma mais frequente.
Aliás, a definição do perfil do investidor perpassa, necessariamente, pela consideração dos aspectos fiscais. Isto porque, no Brasil, ao contrário do que ocorre na maioria dos países, os dividendos recebidos são isentos de imposto de renda.
No entanto, quando o investidor se desfaz de um investimento, obtendo um ganho nessa operação (custo de aquisição menor do que o custo de alienação), ele deverá arcar com a tributação incidente sobre o ganho de capital, o qual conta com alíquotas de 15% até 22,5%, dependendo do valor do ganho.
A política de distribuição de dividendos adotada pela Companhia é fator preponderante nas tomadas de decisão de investimento. Sabendo da relevância deste assunto, a Lei das Sociedade Anônimas (Lei n. 6.404/1976) faz inúmeras menções aos dividendos. Dentre elas, podemos mencionar a prevista no art. 17, § 3º, de que os dividendos não poderão ser distribuídos em prejuízo ao capital social.
Esta disposição é consequência do princípio da intangibilidade do capital social, segundo o qual os valores constantes na conta do capital social não podem servir para o pagamento de dividendos ou juros sobre capital próprio. Aliás, o capital social de uma Companhia, em regra, não poderia nem ser diminuído, salvo se houver perdas ou se for julgado excessivo, devendo tal redução ser decidida em Assembleia Geral Extraordinária, como prevê a Lei 6.404/76.
Por fim, vale ressaltar que a decisão pela destinação do lucro auferido pela Companhia, respeitado o mínimo de distribuição previsto no seu Estatuto Social (25% se for de capital aberto), será tomada em Assembleia Geral Ordinária, mediante votação dos acionistas da proposta oferecida pelos órgãos de administração.
Assim, além das distribuições dos lucros auferidos, a Companhia poderá optar por destinar tais valores a algumas contas de patrimônio líquido: as chamadas “reservas”.
Conforme consta na Lei das S/A, existem vários tipos de reservas. São elas: reserva legal, reserva estatutária, reservas para contingências, reservas de incentivos fiscais, reservas de retenção de lucros, reservas de lucros a realizar e reservas de capital. Cada uma tem um propósito e regramento específico, os quais estão previstos nos artigos 195 a 200 da Lei n. 6.404/76.
Considerando a importância da política de distribuição dos dividendos nos processos de tomada de decisão dos investidores, e ainda levando em conta a relevância deste assunto na legislação societária, exemplificada pelos dispositivos legais acima mencionados, as Companhias devem se empenhar na busca de uma solução ótima de remuneração para os seus acionistas, sem que isto implique em prejuízo para os demais pilares de responsabilidade das Companhias (ambiental, social e de governança). Esta tarefa não pode, sob nenhuma circunstância, ser negligenciada, sob pena de causar prejuízos irreparáveis à Companhia e aos stakeholders.