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Crédito de carbono e a constituição de um mercado protecionista e desenvolvimentista: o grande desafio do século

A preocupação com a questão climática/ambiental vem tomando forma no debate mundial, especialmente após o Protocolo de Kyoto. Nos últimos anos, a agenda ambiental ganhou relevância com o surgimento do modelo ESG, que tomou forma somando o crescimento econômico com a proteção ambiental. Seguindo este caminho, outros temas ambientais vêm ganhando notoriedade no debate mundial, como a estruturação de projetos e pesquisas em energia renovável e o ressurgimento do mercado de carbono. É justamente neste último ponto que iremos tratar, o que vem a ser o mercado de carbono e quais as repercussões?

O Mercado de Carbono é uma ferramenta fundamental para enfrentar os desafios das mudanças climáticas e promover o desenvolvimento econômico sustentável. Por meio desse mercado, são incentivadas a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) e a adoção de práticas mais limpas e sustentáveis. No atual desenho, surge como um mecanismo que concilia o crescimento econômico por meio da proteção ao meio ambiente, sendo desenvolvido de forma especial no mercado europeu, especialmente após 2005 onde sua estrutura começou a ser construída.

O existe a construção de um sistema de compra e venda de créditos de carbono, onde empresas e governos podem compensar suas emissões de gases de efeito estufa por meio de projetos de redução ou remoção dessas emissões. Basicamente, as empresas e governos que conseguiram reduzir a emissão desses gases poderão monetizar a sua redução; por outro lado, empresas que não conseguiram, poderão realizar a compensação adquirindo esses créditos.

É baseado no princípio de que a redução de emissões deve ser uma responsabilidade compartilhada, onde aqueles que emitem menos podem vender suas reduções para aqueles que emitem mais. Pensamento similar ao que acontece no programa brasileiro do RENOVABIO, que tem como resultado a emissão e circulação dos CBIOS.

Ao atribuir um valor econômico às emissões de carbono, o Mercado cria um incentivo para que empresas e governos adotem medidas de redução. As empresas que conseguem reduzir suas emissões podem vender os créditos excedentes, gerando receita e incentivando a implementação de práticas mais sustentáveis. Isso estimula a inovação tecnológica, o aumento da eficiência energética e o investimento em energias renováveis.

Por meio do desenvolvimento deste novo mercado – na verdade nem tão novo assim, já que foi criado no final da década de 70 – pode-se viabilizar financeiramente projetos que promovem a sustentabilidade e a preservação ambiental. Iniciativas como reflorestamento, uso de energias renováveis, eficiência energética e tratamento de resíduos podem gerar créditos de carbono, que posteriormente poderão ser monetizados por meio da sua venda no mercado regulado ou no mercado voluntário (não regulado).

Por ser uma demanda em desenvolvimento, vários aspectos indutores serão necessários, tanto por parte dos Governos, como da iniciativa privada. Basicamente, tem-se atualmente duas estratégias definidas: uma regulação direta estatal, obrigando que as empresas adotem determinadas medidas visando a compensação e/ou a redução das emissões; um outro ponto é a construção de incentivos para a precificação do carbono, tornando-o um ativo financeiramente atraente a ser comercializado.

Neste momento que surge a importância de existir um mercado para a realização dessas operações. Hoje se discute dois formatos possíveis: o regulado, em que há interação entre os setores, bem como um desenho normativo para o setor; já o voluntário, os players (ONGS, instituições, governos e cidadãos), assumem o papel ativo de compensar as emissões, adquirir créditos de carbono (redução na emissão ou captura de carbono).

O assunto vem ganhando corpo, especialmente no mercado financeiro. Uma parceria entre a B3 e o BNDES desenvolveu o Índice de Carbono Eficiente (ICO2), o qual atrela o crescimento econômico com o desenvolvimento sustentável. É formado por empresas listadas no índice IBrX50 (índice que abarca as 50 companhias mais negociadas na bolsa) e que adotem boas práticas nas emissões de gases do efeito estufa. Para fazer parte do ICO2, as companhias devem reportar dados de seu inventário anual de gases do efeito estufa. Trata-se de uma forma de estímulo para que as companhias inseridas no IBrX50 divulguem e monitorem suas emissões.

O ICO2 conta com companhias como a AMBEV, Arezzo, Azul, Bradesco, Banco do Brasil, BRF, entre outras. Por ser um índice do mercado financeiro, não é possível investir diretamente; contudo, existe o ETF ECOO11 (gerido pela Blackrock), que acompanha a rentabilidade do índice carbono eficiente.

Outro ponto de referência é no comércio exterior com países europeus. Em decorrência do projeto europeu em reduzir as emissões em 55% até 2030 em comparação ao ano de 1990, uma etapa para atingir o objetivo de se tornar neutra em carbono até 2050, políticas descarbonizantes estão sendo tomadas, entre elas: o estabelecimento de barreiras protecionistas a fim de proteger as economias dos países integrantes do bloco – os quais deverão adotar regras rígidas de redução na emissão de GEE –  e, assim, impedir a entrada de produtos mais baratos e originários de países com regras descarbonizantes menos rígidas ou inexistentes. Neste contexto surge o “imposto de fronteira”, que estabelecerá uma sobretaxa para produtos de acordo com as emissões de carbono do país de origem; há também o surgimento de regras que proíbem a entrada de commodities oriundas de áreas de desmatamento.

O Mercado de Carbono renasce de forma mais robusta em relação ao passado, porém ainda necessita de muito debate e aprimoramento. É uma ferramenta apta a proporcionar recursos para o desenvolvimento de projetos ambientais e empresariais, contribuindo para a redução das emissões e para a geração de desenvolvimento econômico. Este será o grande desafio a ser superado pelos Governos e pelo setor produtivo: como fazer a economia crescer de forma sustentável?

Colunista

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Pedro Carvalho
Advogado e Professor Universitário com mestrado em Direito pela UFPE. Especialista em Contratos pela Harvard University e em Negociação pela University of Michigan. Sócio do Carvalho, Machado e Timm Advogados, liderando a área de Regulação, Infraestrutura, Energia e Sustentabilidade. Experiência destacada na docência na UNICAP, IBMEC e PUCMinas.

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