Razão de decidirTJMG

O cancelamento de protesto regularmente efetuado é ônus do devedor

É sabido que qualquer título de crédito ou documento de dívida pode ser protestado perante o Tabelionato de Protesto de Títulos, gerando para o devedor diversas restrições de natureza financeira.

O ato é gratuito para o credor, ficando o devedor responsável pelo pagamento das custas cartorárias, salvo se o credor desistir do protesto ou restar vencido em eventual demanda judicial.

O artigo 26 da Lei 9.492/1997 estabelece que o cancelamento do registro de protesto pode ser solicitado diretamente no Tabelionato de Protesto de Títulos por qualquer interessado, sendo evidente que o maior interessado é o próprio devedor.

Assim, pelo regime da referida Lei 9.492/1997, o credor não está obrigado a requerer o cancelamento do protesto quando sobrevier o pagamento do débito, salvo no caso de cláusula contratual expressa nesse sentido.

Esse entendimento foi pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça quando do julgamento do Tema Repetitivo 725, que fixou a seguinte tese: “No regime próprio da Lei n. 9.492/1997, legitimamente protestado o título de crédito ou outro documento de dívida, salvo inequívoca pactuação em sentido contrário, incumbe ao devedor, após a quitação da dívida, providenciar o cancelamento do protesto”.

Assim, no caso de o protesto ter sido realizado regularmente, havendo o pagamento da dívida, ao devedor incumbe o pedido de cancelamento da restrição junto ao Tabelionato de Protesto de Títulos.

Embora o Tema Repetitivo 725 do STJ tenha sido julgado no ano de 2014, ainda existem demandas que discutem a responsabilidade pelo cancelamento do protesto regulamente realizado.

O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, ao analisar o processo 1.0000.24.154975-7/001, à unanimidade, negou provimento ao recurso de apelação cível, mantendo a sentença que julgou improcedente o pedido de indenização por dano moral em razão de protesto não baixado pelo credor, após o pagamento da dívida.

Entendeu o Tribunal Mineiro que:

a) o protesto de título em nome do consumidor em razão do inadimplemento configura exercício regular de um direito do credor; e

b) a responsabilidade pelo cancelamento do protesto após o pagamento da dívida é ônus do consumidor.

Eis a ementa do referido julgado:

 

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – FATURA DE ENERGIA ELÉTRICA – DÉBITO INCONTROVERSO – PROTESTO – PAGAMENTO EXTEMPORÂNEO – CANCELAMENTO DO PROTESTO – ÔNUS DO DEVEDOR – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. 1. Tratando-se de débito incontroverso, a ausência de pagamento na data do vencimento autoriza o protesto do título. 2. Após o pagamento extemporâneo do débito, incumbe ao devedor a providência para cancelamento do protesto legitimamente realizado. 3. Atuando a concessionária em exercício regular de direito, não há falar em ato ilícito e, consequentemente, em dano moral indenizável. (TJMG – Apelação Cível 1.0000.24.154975-7/001, Relator(a): Des.(a) Maria Cristina Cunha Carvalhais, 2ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 11/06/2024, publicação da súmula em 14/06/2024)

 

No caso apreciado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, o consumidor pretendia ser indenizado moralmente pela ausência de cancelamento do protesto pela concessionária de energia elétrica, após o pagamento do débito.

O magistrado de primeiro grau entendeu que “a responsabilidade pelo cancelamento do protesto é do devedor e as obrigações do credor estão limitadas à apresentação de declaração de anuência, não havendo comprovação de que autor a solicitou ao réu e que houve negativa”.

A sentença foi mantida com o mesmo fundamento destacando o voto condutor que “incumbindo ao devedor a providência para cancelamento de protesto legitimamente realizado, não há falar em ato ilícito praticado pela ré afastada a alegação de dano moral e, consequentemente, o dever de indenizar”.

O julgado demonstra que, mesmo diante da ampla divulgação dos julgamentos dos Tribunais Superiores, os cidadãos ainda não estão suficientemente informados sobre seus direitos e deveres.

No caso, a ação foi ajuizada em 2023 pretendendo imputar ao credor ato ilícito pela manutenção de protesto após o pagamento da dívida, mesmo que no ano de 2014 o STJ tenha afirmado que a responsabilidade pelo cancelamento do protesto é do devedor.

 

Colunista

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Glaucia Chiaradia
Mestre em Direito Empresarial. Assistente Judiciário (2009-2014) e Assessora Judiciária (2014 em diante) no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG).

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