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Reduzindo a assimetria informacional: como o Legal Operations impulsiona a eficiência jurídica corporativa

Neste segundo texto da série sobre Teoria Econômica aplicada ao Direito, a famosa Análise Econômica do Direito, irei tratar do conceito de assimetria informacional. Termo que tem uma abrangência grande no mundo jurídico, especialmente diante de procedimento de negociação contratual, elaboração de seguros, casos de recuperação judicial, entre outros. Neste texto, irei focar como o legal operations pode agir para reduzir a assimetria informacional.

O Legal Operations está se destacando como um elemento transformador na maneira como os times jurídicos agregam valor aos seus clientes. Uma recente análise da Gartner delineou estratégias para auxiliar o setor jurídico a operar efetivamente em meio a uma volatilidade crescente, ressaltando a importância dos profissionais jurídicos como guias na gestão de riscos e participantes ativos no processo decisório. Este relatório posiciona o time jurídico no epicentro das operações, destacando-o como fornecedor de insights estratégicos e catalisador de uma cultura organizacional dinâmica, capacitada por líderes adaptáveis e flexíveis, que investem em pessoas, tecnologia e conhecimento.

O Legal Operations atua como um redutor de assimetria informacional, promovendo a conexão e o fluxo contínuo de informações entre os diversos setores da organização. Ao estabelecer canais eficientes de comunicação, o Legal Operations permite que os profissionais jurídicos participem ativamente do processo decisório, munindo-os com um arcabouço informativo abrangente e atualizado.

Essa abordagem não apenas facilita a tomada de decisão, fornecendo uma base sólida de informações, mas também prepara o departamento jurídico para lidar com demandas administrativas ou judiciais de forma proativa. Com acesso a insights detalhados sobre as operações da empresa, o jurídico interno pode colaborar de maneira mais eficaz com os escritórios contratados, compartilhando informações relevantes e alinhando estratégias para proteger os interesses da organização.

A assimetria de informações é uma realidade intrínseca em qualquer ambiente organizacional. Desde os primórdios, diferentes níveis hierárquicos detêm distintos conjuntos de dados e perspectivas estratégicas. Esse fenômeno, muitas vezes inevitável, cria lacunas entre a alta administração e os níveis mais operacionais, dificultando a disseminação uniforme de conhecimento e, consequentemente, impactando a eficácia das decisões tomadas.

Um exemplo clássico que ilustra a assimetria informacional é o caso do lemon market, ou mercado de limões. Nesse contexto, vendedores desonestos têm vantagem sobre os compradores devido à posse de informações privilegiadas sobre a qualidade dos produtos, enquanto os compradores carecem desses detalhes, resultando em transações desvantajosas para eles.

No ambiente jurídico corporativo, a assimetria de informações também é uma realidade significativa. Os advogados internos frequentemente se deparam com o desafio de navegar por um mar de dados desigualmente distribuídos entre os diversos departamentos da empresa. No entanto, com o advento do Legal Operations, surge uma oportunidade única de reduzir essa disparidade.

De acordo com o relatório da Gartner, o setor jurídico enfrentará mudanças significativas até 2025, incluindo a necessidade de responder rapidamente às demandas, focar no processo decisório, considerar as tarefas como meios para solucionar demandas e desenvolver habilidades interpessoais. Essas transformações refletem a evolução do papel do departamento jurídico, exigindo uma abordagem mais ágil, orientada para resultados e focada no cliente.

Em consonância com a abordagem apresentada em um artigo anterior, todas as propostas de mudança destacam a necessidade dos departamentos jurídicos concentrarem esforços na formação de equipes diversificadas, promovendo uma integração efetiva de diferentes áreas de atuação. Essa abordagem visa ampliar o espectro de conhecimentos disponíveis, facilitando assim o processo de tomada de decisão.

O entendimento da psicologia comportamental emerge como uma ferramenta indispensável para os gestores jurídicos, uma vez que a gestão eficaz dos vieses cognitivos torna-se cada vez mais crucial para atender às necessidades organizacionais. A habilidade de gerir uma equipe diversificada, composta não apenas por advogados, mas também por profissionais de outras disciplinas, assume um papel central. De fato, as contratações futuras tenderão a ser baseadas em competências não jurídicas, como o domínio da gestão de dados, refletindo uma mudança de paradigma no perfil do profissional jurídico.

A figura do advogado como empreendedor ganha destaque nesse cenário em evolução. É imprescindível que os advogados desenvolvam habilidades de gestão e compreendam profundamente os desafios e oportunidades enfrentados pelos clientes. O perfil do advogado que se limita ao escritório está sendo substituído pela figura do profissional que mergulha no ambiente do cliente, compreende seu negócio e identifica suas necessidades e potenciais. Essa transformação reforça a importância do advogado como um parceiro estratégico e não apenas como um consultor legal isolado.

Nos setores regulados, o conhecimento extrajurídico e a interconexão entre diferentes áreas assumem uma importância significativa. Tenho notado uma tendência das empresas em separar suas áreas jurídica e regulatória, como se fossem dois universos distintos. Entretanto, defender uma empresa em um processo sancionador requer um profundo entendimento do setor regulado, conferindo vantagens operacionais substanciais. Isso transcende a mera busca por falhas procedimentais, permitindo uma abordagem mais efetiva na defesa dos interesses da empresa. Não há justificativa para a segregação dos profissionais jurídicos dos departamentos de engenharia ou marketing, por exemplo; permitindo, desse modo, uma redução da assimetria informacional.

O departamento jurídico passa a operar dentro de uma matriz de responsabilidades, na qual as funções e etapas do projeto são compartilhadas, proporcionando maior previsibilidade e fomentando uma colaboração mais estreita entre os diversos setores. Assim, o papel do departamento jurídico deixa de ser reativo, limitando-se a responder a demandas judiciais, para se tornar proativo na concepção e execução de projetos. A implementação de uma governança eficaz, com papéis e responsabilidades claramente definidos, é fundamental para evitar que qualquer área assuma riscos não identificados ou dimensionados.

É cada vez mais essencial que o departamento jurídico interno esteja especializado em questões regulatórias, permitindo um acompanhamento em tempo real das agendas das agências reguladoras. Muitas vezes, esses profissionais servem como elo entre os valores empresariais e o suporte externo fornecido por escritórios de advocacia contratados, desempenhando um papel crucial na mitigação de riscos e na promoção da conformidade regulatória.

O campo do Direito está atravessando mudanças profundas, e contar com Legal Operations para mapear, remediar e administrar os indicadores relacionados à operação, a identificação da necessidade de procedimentos operacionais padronizados, o monitoramento de auditorias e o mapeamento de riscos, especialmente os regulatórios e contratuais, são diferenciais que um setor jurídico estruturado pode oferecer à operação.

A falta de clareza, alinhamento e senso de pertencimento ao plano estratégico pode levar as pessoas a se dedicarem exclusivamente a questões adjetivas ou a projetos de curto prazo, em vez de priorizarem atividades alinhadas com as metas estratégicas de médio e longo prazo.

Profissionais jurídicos, sejam internos, de escritórios de advocacia ou de prestadores de serviços alternativos, não devem ser deixados de fora das iniciativas que visam à execução eficaz do planejamento estratégico. Envolvê-los na construção e implementação das metas e ações derivadas do planejamento estratégico fortalece parcerias, alinha expectativas e garante resultados positivos, proporcionando a todos uma visão clara e uma direção a seguir.

As estruturas de Legal Ops e Eficiência Jurídica devem ser percebidas como catalisadores da gestão e da estratégia, assegurando um alinhamento estreito com as necessidades das partes interessadas e as direções corporativas gerais. Para isso, os advogados precisam adotar uma mentalidade mais operacional, integrando-se à estrutura da empresa em vez de se concentrarem apenas em fontes legais tradicionais.

Em suma, o Legal Operations não apenas transcende a barreira da assimetria de informações, mas também fortalece a capacidade da empresa de tomar decisões informadas e estratégicas em todos os níveis hierárquicos. Ao promover uma cultura de transparência e colaboração, o Legal Operations se posiciona como um elemento-chave na busca pela eficiência e excelência jurídica nas organizações modernas.

 

Colunista

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Pedro Carvalho
Advogado e Professor Universitário com mestrado em Direito pela UFPE. Especialista em Contratos pela Harvard University e em Negociação pela University of Michigan. Sócio do Carvalho, Machado e Timm Advogados, liderando a área de Regulação, Infraestrutura, Energia e Sustentabilidade. Experiência destacada na docência na UNICAP, IBMEC e PUCMinas.

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