A atual impossibilidade de acumulação de cargos públicos por Policial Penal no Estado de Minas Gerais
Cediço que a regra constitucional é de proibição de acúmulo de cargos públicos, sendo a acumulação acolhida como exceção nos casos previstos nas alíneas a, b e c do inciso XVI do artigo 37 da Constituição da República e desde que haja compatibilidade de horários.
Assim, sendo a acumulação tratada pela Carta Magna como exceção, certo que deverá ser interpretada restritivamente, vedada à legislação infraconstitucional a ampliação das hipóteses de acúmulo de cargos públicos, sob pena de ser declarada inconstitucional.
A Emenda Constitucional 101/2019 acrescentou o § 3º ao artigo 42 da Constituição da República, estendendo aos militares estaduais, do Distrito Federal e dos Territórios as hipóteses de acumulação de cargos já previstas em seu artigo 37, XVI.
No mesmo ano de 2019, a Emenda Constitucional 104 modificou o artigo 144 da Constituição da República para inserir a Polícia Penal como órgão da segurança pública e atribuiu-lhe a incumbência da segurança dos estabelecimentos prisionais (art. 144, § 5º-A).
Não obstante a EC 104/2019 tenha atribuído aos policiais penais atribuições que antes eram próprias dos policiais militares ou civis, certo que a Constituição da República trata cada uma das carreiras de forma isolada, tanto que nos §§ 1º a 5º-A do seu artigo 144, enumera separadamente as atribuições de cada uma das polícias.
Assim, tratando-se de carreiras distintas, certo que a permissão constitucional de acúmulo de cargos para a Polícia Militar (policiais militares e bombeiros militares) não se estende automaticamente à Polícia Penal.
No âmbito do Estado de Minas Gerais ainda não foi aprovada a Lei Orgânica da Polícia Penal, que poderá ou não equiparar as carreiras das polícias militar e penal, considerada a autonomia do ente federativo para regulamentar sua própria estrutura e cargos públicos.
Caso ocorra a referida equiparação, certo que o § 3º do artigo 42 da Constituição da República poderá ser aplicado aos policiais penais. Até lá, as hipóteses de acumulação de cargos devem ser rigorosamente observadas.
O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, no julgamento da apelação cível 1.0000.22.050131-6/002 negou provimento ao recurso, mantendo a sentença com fundamento diverso.
Um policial penal impetrou mandado de segurança com o objetivo de assegurar a acumulação do cargo de policial penal com o cargo de agente de saúde, sendo denegada a ordem em primeiro grau sob o fundamento de incompatibilidade de horários.
Entendeu o Tribunal Mineiro que:
a) a Constituição da República trata cada uma das polícias de forma isolada em seu artigo 144;
b) o Estado de Minas Gerais ainda não editou a Lei Orgânica da Polícia Penal, inexistindo, ao menos até o momento, eventual equiparação da carreira da polícia penal à carreira dos militares;
c) embora o cargo de agente comunitário de saúde seja privativo de profissionais da saúde com profissão regulamentada, o impetrante não ocupa outro cargo da saúde e não é militar;
d) atualmente, o cargo de policial penal não pode ser acumulado com qualquer outro cargo público por ausência de autorização constitucional.
Eis a ementa do referido julgado:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – MANDADO DE SEGURANÇA – POLICIAL PENAL – CUMULAÇÃO COM OUTRO CARGO PÚBLICO – VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL – EXCEÇÕES DO ARTIGO 37, XVI, DA CR – NÃO OCORRÊNCIA – EXCEÇÃO DO ARTIGO 42, § 3º, DA CR – INAPLICABILIDADE. 1. A Constituição da República veda a cumulação de cargos ou empregos públicos, excepcionando a regra nas alíneas do inciso XVI do artigo 37, que são extensíveis aos militares por força do artigo 42, § 3º, do diploma constitucional. 2. O cargo de agente comunitário de saúde é privativo de profissionais da saúde com profissão regulamentada, só podendo ser cumulado com outro cargo da saúde ou militar. 3. A carreira da Polícia Penal não foi equiparada à carreira Militar, não sendo aplicável ao policial penal a exceção constante do artigo 42, § 3º, da Constituição da República. 4. O cargo de policial penal é inacumulável com outro cargo ou emprego público. (TJMG – Apelação Cível 1.0000.22.050131-6/002, Relator(a): Des.(a) Maria Cristina Cunha Carvalhais, 2ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 12/12/2023, publicação da súmula em 13/12/2023)
No caso apreciado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, o impetrante pretendia acumular os referidos cargos ao argumento de que havia compatibilidade de horários e que não há vedação constitucional à acumulação apenas porque um dos cargos é de dedicação exclusiva.
Contudo, conforme decidido pelo Tribunal Mineiro, o impedimento não estava apenas no requisito compatibilidade de horários, que também não foi preenchido, mas na própria natureza de um cargos ocupados pelo impetrante: policial penal.
O cargo de policial penal não está elencado nas hipóteses das alíneas a, b e c do inciso XVI do artigo 37 da Constituição da República e, até o momento, não foi equiparado pela legislação mineira ao militar, não podendo ser aplicada a regra constante do artigo 42, § 3º, também da Constituição da República.