Aulas de Civil e de Processo CivilDireito Processual Civil

Aula 14 – A Tutela Provisória no CPC – 8ª. Parte: regramento geral (arts. 294-299), a postulação na tutela provisória – 1ª. Parte

Não são poucos os temas referentes ao regramento geral tutela provisória.

 

Para além do que já foi visto, especialmente as espécies de tutela provisória, suas finalidades e seus modos de concessão, tudo isso previsto no art. 294, caput e parágrafo único, destacam-se:

 

i) a revogabilidade (arts. 296 e 298);

 

ii) a competência (art. 299);

e (iii), muito embora mal alocada no CPC, a responsabilidade por danos causados (art. 302).

Há um tema, porém, que se encontra subentendido, pois que praticamente não estabelecido nos dispositivos citados no título, conquanto haja certa sugestão acerca dele no art. 295.

 

Trata-se da postulação na tutela provisória.

 

Não obstante sua parca regulação, é tema fundamental. Pragmaticamente, ao lado do problema da fundamentação das decisões em tutela provisória. o mais fundamental de todo o sistema.

 

É necessário, portanto, analisá-lo em suas nuances, nuances subentendidas dele.

 

Desse modo, destaquemos seus pontos introdutórios mais relevantes:

 

i) estamos a tratar do requerimento de tutela provisória como um todo, e não restrito à espécie que seja, como a tutela de urgência;

ii) o requerimento de tutela provisória, além de consistir num pedido próprio, tem um fundamento próprio. Há, nesse sentido, uma verdadeira demanda de tutela provisória.

 

Demanda esta, aliás, que pode ser formulada em petição própria, como na tutela antecipada antecedente (art. 303, CPC) e, até mesmo, na tutela provisória requerida de modo incidental (art. 295, CPC).

 

Uma petição, enfim, de tutela provisória.

 

E isso sem nos esquecermos que a demanda de tutela provisória pode ser autônoma em relação a qualquer outra, isto é: todo o processo envolver apenas o pedido de tutela provisória. É o caso, por exemplo, da chamada tutela de urgência satisfativa autônoma e da chamada tutela cautelar autônoma, ambas, referentes ao gênero tutela provisória autônoma, a qual, no momento oportuno, será devidamente analisada;

 

iii) tudo isso, em suma, nos mostra que não há como não analisar a postulação na tutela provisória separadamente, observando sua propriedade, sua autonomia etc.

 

Desse modo, a proposta aqui é estudar a composição e a forma dessa demanda de tutela provisória.

 

A forma, acima mencionada, de algum modo, já vimos, pois que falamos, por exemplo, de a tutela poder ser requerida de modo antecedente e incidente, conforme o p. único do art. 294, CPC, mas também podendo sê-lo de modo concomitante e, até mesmo, autônomo, isto é: não atrelado a uma postulação dita principal.

 

Mais que isso, já identificamos que, em rigor, as chamadas tutelas de urgência e de evidência são verdadeiras espécies de tutela provisória, isto é: são formas de tutela.

 

Portanto, vamos nos dedicar agora a analisar a composição (conteúdo) da demanda de tutela provisória.

 

Bem, como qualquer composição, ela é formada por um pedido (ontologicamente) e uma causa de pedir (deontologicamente).

 

Existem, pois, pedido e causa de pedir na demanda de tutela provisória.

 

Mas por que o pedido na demanda (inclusive, na de tutela provisória) se dá ontologicamente, e a causa de pedir, deontologicamente?

 

Como o termo demanda é empregado – metaforicamente – para designar um ato de procura da tutela jurídica, esse ato consiste num pedido, já que o objeto procurado só pode ser dado por outro sujeito, que é o Estado-juiz. Logo, em termos judiciais ao menos, quem procura, em verdade, pede.

 

Em termos judiciais, ao menos, a procura é um pedido.

 

Por isso que o pedido compõe a demanda por algo de ordem ontológica: ele é parte essencial dela.

 

Sem pedido não há demanda, pode haver outro ato, mas não demanda.

 

Já a causa de pedir somente se faz necessária diante de outra perspectiva.

 

A causa é necessária por uma razão de ordem democrática.

 

Por quê?

 

Porque, como esse pedido repercutirá em desfavor de outrem, somente haverá legitimação do ato de concessão do pedido se houver uma razão – acima de tudo, jurídica – para tanto.

 

É preciso legitimar a concessão do pedido.

 

É preciso fundamentar, enfim, a decisão que concede a tutela requerida.

 

E, antes, é necessário que aquele contra quem se quer algo possa contrapor-se.

 

Possa, nalguma medida, se defender.

 

Mas, para isso, antes de tudo, ele precisa saber do que está se defendendo.

 

Ao que ele está resistindo.

 

Isto é: da suposta razão jurídica do pedido.

 

Resiste-se, enfim, do fundamento invocado para se pedir.

 

Por isso é necessária a indicação da causa de pedir.

 

Se não houvesse, porém, o sistema democrático, seria possível dizer que um pedido poderia ser deferido somente por si.

 

Num sistema não democrático, a sociedade se perfaz – antes de tudo – por uma diferença entre privilegiados e excluídos, e os primeiros não precisam justificar porque devem prevalecer.

 

Observem que a relação entre causa de pedir e pedido não é de causalidade natural.

 

É de dever ser.

 

Causa de pedir – embora se refira ao chamado direito material – não se confunde com ele.

 

Causa de pedir é uma descrição.

 

Descrição daquilo que – acima de tudo, juridicamente – justifica o que se pede.

 

E observem, se se pede algo contra alguém, é porque, de algum modo, entende-se ter outro em desfavor dele.

 

Grosso modo, entende-se que se tenha um direito.

 

Esse direito, porém, existe não por si, mas sim dentro do sistema que o prevê.

 

E, por isso, para que alguém adquira um direito, é necessário que ocorra aquilo que o sistema prevê.

 

Isto é: que se dê a situação fática prevista.

 

Eis a razão de a causa de pedir consistir, antes de tudo, numa descrição de fatos.

 

Dos fatos que justificam o pedido, isto é: dos fatos que possibilitam a aquisição do direito invocado. Os fatos mencionados no inciso III do art. 319, CPC.

 

E isto também com a causa de pedir na demanda de tutela provisória.

 

Resta-nos saber que fatos são esses no âmbito da tutela provisória.

 

Nesse sentido, até porque, como já sabemos, a causa de pedir funciona como a justificação democrática do pedido, é preciso – para desvendar a causa – primeiro estabelecer qual é o pedido.

 

O pedido nos vem intuitivamente; a causa é obtida, assim, por indução do pedido.

 

Logo, temos de começar a estruturar a petição de tutela provisória – como em qualquer outra petição – pelo pedido.

 

Assim, em que consiste o pedido de tutela provisória?

 

Temos de ver isso numa perspectiva formal e numa perspectiva material.

 

No caso da demanda de tutela provisória, a perspectiva formal do pedido é ressaltada.

 

Por quê?

 

Porque há formas delineadas de tutela provisória.

 

São elas, basicamente, a tutela de urgência e a tutela de evidência.

 

Assim, formalmente, o pedido de tutela provisória consiste num pedido de tutela de urgência ou num pedido de tutela de evidência.

 

Ou, até mesmo, uma forma híbrida delas.

 

Porém, ao falar de tutela de urgência e de tutela de evidência, somente se faz alusão ao aspecto formal; não se estabelece no que consiste propriamente a tutela, e o pedido referente a ela

 

Esse consistir é o aspecto material do pedido.

 

No caso, do pedido de tutela provisória.

 

Esse aspecto material refere-se ao que, de fato, se quer do sujeito a quem se pede: o juiz, no caso.

 

Quando se pede ao juiz uma tutela provisória, já se pede algo, mas ainda muito pouco; quando se pede uma tutela de urgência, por exemplo, já se pede mais, mas ainda bem pouco. É preciso especificar mais: até porque o regramento geral do pedido aplica-se ao pedido de tutela provisória, incluindo a regra que estabelece os requisitos do pedido (art. 322, CPC).

 

A regra, no caso, que diz que o pedido tem de ser certo e determinado.

 

Isto tem a ver com o aspecto material do pedido.

 

A quem dedicaremos a próxima aula.

Até lá.

Colunista

Avalie o post!

Incrível
0
Legal
0
Amei
0
Hmm...
0
Hahaha
0
Roberto Campos
Doutor e Mestre em Direito Processual pela Universidade Católica de Pernambuco (Unicap). Professor de Direito Civil e de Direito Processual Civil da Unicap. Ex-Presidente da Associação Brasileira de Direito Processual (ABDPro). Advogado e Consultor Jurídico.

    Você pode gostar...

    Leave a reply

    O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *