ArbitragemÁrea jurídicaDestaques recentesDisruptivo

5 Estratégias Processuais Probatórias para aplicar na sua próxima Arbitragem

Uma das frases que mais se ouve numa sala de audiências de um processo arbitral é mais ou menos assim: “defiro o pedido da [Requerente/Requerida], para evitar futura alegação de nulidade”.

 

De fato, quem frequenta os Tribunais Arbitrais sabe que são enormes as chances de o processo arbitral ser apenas a primeira etapa, e que a parte vencida, por qualquer mínima e imaginada razão de nulidade, buscará uma anulação na Justiça como uma segunda etapa, com todos os recursos e incidentes que se tem direito.

 

Seja pela cultura de “recorrer de todo jeito”, seja pela flexibilidade do processo arbitral, que costuma render muitas ideias aos Advogados para tentarem uma anulação posterior, o fato é que a prometida – e dispendiosa – celeridade do processo arbitral acaba inúmeras vezes sendo sucedida pela já não tão célere Justiça Comum ordinária, com direito a anos de continuidade do litígio, liminares, cautelares, agravos, apelações, recursos aos Tribunais Superiores, efeitos suspensivos, e tudo o mais que impeça ou dificulte a execução da sentença arbitral.

 

As cinco estratégias probatórias adiante propostas, embora não tenham o propósito de promover substancial alteração neste crônico script da arbitragem no Brasil, ocupam-se, ao menos, de aumentar as chances de uma robusta vitória processual sem que se gerem “novas” nulidades, principalmente ao se propor, como regra basilar para sua aplicação, a inderrogável manifestação de aquiescência, via consentimento das partes, sempre que uma delas for requerida pelas partes ou sugerida pelo árbitro ou Tribunal Arbitral.

 

Se, de um lado, “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (inciso XXXV, art. 5º, CF), de outro um processo arbitral robustecido de provas, contraditório e ampla defesa, somada a uma sentença arbitral bem fundamentada, contribuirão para que a celeridade e a técnica, características mais almejadas por quem busca o processo arbitral, estejam, tanto quanto possível, também presentes na apreciação judicial das “nulidades” que serão alegadas pelas partes derrotadas.

 

Atenção, pois, aos acordes iniciais de instauração da arbitragem, pois são justamente nos debates que precedem a assinatura do Termo de Arbitragem que se apresentará a principal oportunidade de emplacar as estratégias probatórias que façam mais sentido para o seu caso.

 

Estratégia nº 1: Inversão da ordem de produção das provas.

 

A audiência, via de regra, é o ponto alto do processo arbitral.

 

Na prática, observa-se uma prevalência, nos regulamentos das Câmaras Arbitrais, da produção imediata da prova pericial (quando esta é requerida por uma ou ambas as partes, ou determinada ex officio), para posterior início da tomada de depoimentos na tão esperada audiência arbitral.

 

Contudo, por vezes se observa que o trabalho técnico pericial poderia ter um escopo bastante reduzido, ou mesmo ser dispensado, caso tivessem sido tomados os depoimentos das testemunhas em primeiro lugar.

 

A razão para que a grande maioria dos regulamentos, ou, no silêncio destes, dos painéis de árbitros formados, decidam pela produção da prova pericial antes da testemunhal é justamente a realização de uma audiência que observará uma sequência de atos bastante conhecida: a inauguração com as Alegações Iniciais, seguidas dos depoimentos das partes e de suas testemunhas, e fechada com as Alegações Finais, a encerrar o procedimento antes da prolação da Sentença Arbitral.

 

O abandono desta “receita de bolo” teria o “incômodo” de não se realizar uma audiência como “o” grande acontecimento no processo arbitral. Em verdade, isso só se tornou um costume em razão dos processos arbitrais normalmente serem conduzidos em casos que envolvem grandes somas, nos quais as partes e os Tribunais envolvidos “glamourizam” o momento da audiência realizando-as com grande pompa e luxo.

 

Veja-se que a prova testemunhal colhida antes da prova pericial acaba contribuindo não somente para a conclusão mais célere do procedimento, como também para a otimização dos trabalhos periciais, direcionando-os aos temas menos esclarecidos e mais técnicos. Conforme aponta o saudoso árbitro e professor José Emilio Nunes Pinto:

 

“Casos concretos demonstram, à saciedade, que a produção da prova testemunhal com anterioridade à prova pericial maximiza os benefícios desta última e concorre para que se abreviem prazos para a conclusão do procedimento. Servindo-se da prova pericial na sequência da prova testemunhal, ganha-se em qualidade e em utilidade da prova a ser produzida.”[1]

 

Cabe ressaltar, por fim, que caso existam aspectos que não foram devidamente esclarecidos pela perícia realizada, os árbitros dispõem de toda a autoridade para determinar a realização de nova oitiva das partes e/ou das testemunhas que depuseram sobre os fatos que porventura exijam maior aclaramento, se for este o caso.

 

Estratégia nº 2: Alegações Mediais.

 

O processo arbitral é um lugar em que flexibilidade e firmeza precisam andar juntas e de forma harmoniosa.

 

Por este motivo, qualquer modificação, inclusão ou exclusão no procedimento, deve se dar, sempre que possível, com a ciência e consentimento de ambas as partes. Do contrário, abre-se amplo espaço para questionamentos futuros, o que acaba por minar as duas principais vantagens do processo arbitral: a celeridade e a técnica.

 

Entretanto, não se deve perder de vista que os árbitros, juristas ou não, são seres humanos, sujeitos, por esta condição, a distrações, enganos, embaralhos e confusões.

 

Se as alegações iniciais são de grande valia para o aclaramento das teses que as partes pretendem desenvolver e provar, e as alegações finais, igualmente, prestam papel fundamental para que as partes possam destacar os pontos da instrução probatória que lhes foram mais favoráveis, além de explicar outros tantos que não socorreram propriamente as suas pretensões, parece haver certo hiato no meão instrutório, ou seja, uma lacuna explicativo-argumentativa no meio da instrução.

 

Pouco testada, e menos ainda aplicada, as alegações mediais encontrariam espaço e utilidade nos casos cuja instrução probatória seja complexa, extensa e/ou demorada, como forma de oportunizar aos advogados das partes, em meio ao procedimento, poderem resumir suas teses jurídicas e brevemente criticar as provas até ali produzidas, antecipando a formação do “quebra-cabeças” probatório que se pretende concluir, a fim de que os julgadores melhor o percebam, além de poderem traçar um panorama do que está por vir, com as provas que ainda lhes restam, segundo os objetivos almejados no processo.

 

Longe de ser uma proposição que atrapalhe ou cause demora desnecessária à conclusão do procedimento, as alegações mediais devem ser requeridas pelas partes, ou sugeridas pelo árbitro ou Tribunal, tão somente nos casos de longa e complexa instrução probatória, sempre com a aquiescência de ambos os polos da disputa, e de duração breve – 10 a 15 minutos, no máximo – para que cada parte tenha a oportunidade de despertar a atenção dos julgadores aos pontos que mais lhe interessem na instrução.

 

Vez por outra, fazer com que um árbitro perdido passe a entender melhor o que se passa numa sala de audiências, fará toda a diferença na formação de suas convicções e, consequentemente, no resultado final do julgamento.

 

Estratégia nº 3: Depoimento escrito prévio.

 

Uma forma simples de facilitar o preparo dos advogados para a colheita de depoimentos das testemunhas é determinar às partes que depositem, anteriormente à realização da audiência, um written witness statement de cada uma de suas testemunhas.

 

O documento nada mais seria do que uma declaração de cada testemunha, contendo os temas e um resumo de seus respectivos depoimentos, os quais seriam abertos à parte contrária antes da audiência com dupla função: demarcar os temas ou assuntos que cada testemunha será abordada e possibilitar uma melhor preparação aos advogados que irão tomar seus depoimentos, de forma a reduzir os imprevistos e sobressaltos que, vez por outra, ocorrem nas audiências, e, assim, contribuir para a entrega aos árbitros de uma informação mais clara, completa e transparente.

 

Adverte-se, contudo, que a escolha de garantir às partes a antecipação dos fatos que estarão sob investigação em cada depoimento deve ser tomada com cautela, prevenindo-se e punindo-se a parte que tentar burlar o sistema adotado, mediante apresentação incompleta do depoimento escrito de suas testemunhas, objetivando obter vantagem com o despreparo dos representantes de seu ex adverso através do surgimento de temas ou assuntos sobre os quais o depoimento escrito prévio sequer havia abordado.

 

Estratégia nº4: Core Bundle para uso em audiência.

 

A maior parte das Câmaras Arbitrais brasileiras atualmente já mantêm um processo disponível para consulta das partes e seus procuradores, de forma íntegra, numerada e datada, para garantir fácil e ininterrupto acesso (normalmente eletrônico) de todos os envolvidos.

 

É importante, contudo, pensar na dinâmica da tomada de depoimentos, ocasião em que não só os advogados, mas as próprias testemunhas, necessitam, não raro, consultar documentos referidos nas perguntas que lhe são direcionadas.

 

Logo, a determinação de apresentação de um core bundle prévio, para disponibilização, pelo Tribunal Arbitral, às partes, seus procuradores e às testemunhas, objetivando emprestar maior eficiência aos trabalhos de inquirição das testemunhas, vem bem a calhar quando se fizer necessário organizar e ordenar um volume considerável de documentos, facilitando as consultas e referências necessárias no curso dos depoimentos.

 

É necessário, todavia, que o Tribunal Arbitral determine de forma prévia a padronização da formatação do Core Bundle, para que o instrumento de facilitação de consulta documental não se torne um artifício dificultador mediante a adoção de sistemas pouco práticos de classificação de documentos.

 

Estratégia nº5: Testemunha-perito.

 

Assim como ocorre no processo judicial, também no processo arbitral as partes, via de regra, podem contar com seus respectivos assistentes técnicos, a fim de acompanharem os trabalhos periciais, criticarem o laudo apresentado, apresentarem quesitos iniciais e suplementares, entre outros inúmeros trabalhos de ordem técnica desenvolvidos.

 

Contudo, as perícias por vezes, tornam-se documentalmente muito extensas, acrescidas ainda por impugnações e seus respectivos laudos críticos igualmente extensos, a tornar árdua a missão da busca do melhor entendimento técnico sobre a matéria versada.

 

Com o objetivo de escapar a esta realidade, e ainda, considerando-se o papel de destaque que as audiências possuem nos processos arbitrais, surge a figura da testemunha-perito, também chamada de testemunha técnica (em inglês, consagrada como expert witness).

 

Uma figura pouco vista no Brasil, dada a ausência de previsão legal expressa, não há nada que proíba a sua utilização nas Cortes Arbitrais – desde que, como já prevenido desde o início, haja ciência e concordância prévia das partes com tal possibilidade, seja pelos regulamentos aos quais as partes aderiram, seja por expressa previsão no Termo de Arbitragem firmado no início do processo.

 

A admissão da testemunha técnica deve ser sempre fundamentada pela parte que a requerer, e ainda deve ficar claro pelo Tribunal Arbitral se o depoimento será tomado sob juramento ou não – no primeiro caso, atentando-se às regras de impedimento e suspeição, e, no segundo caso, encarando-se a expert witness como mais um assistente técnico da parte que o arrolou, sem prejuízo de seu depoimento ser tomado também pela parte adversa.

 

A adoção da testemunha perito tem o objetivo de chamar a atenção dos árbitros sobre questões de ordem técnica que a mera leitura dos extensos laudos periciais e críticos não teria a mesma eficiência em elucidar.

 

É bastante comum o seu uso também mediante arrolamento de profissionais do direito, principalmente quando questões referentes a outros ordenamentos jurídicos forem cruciais para o mérito do processo arbitral.

 

Conclusão.

 

A Sentença Arbitral constitui título executivo com a mesma eficácia da Sentença Judicial. Entretanto, por ser passível de declaração de nulidade, em ação própria, submetida ao procedimento comum, prevista no artigo 33, da Lei da Arbitragem, tem por vezes comprometida a sua técnica e celeridade se não robustecida não só pela observância dos predicados do devido processo legal, mas também de tantos elementos probatórios quantos bastem para fundamentação do seu conteúdo decisório.

 

O emprego de uma ou mais das estratégias processuais probatórias sugeridas deve ser, pelos Advogados, sopesado às circunstâncias do seu caso concreto e dos interesses do seu Cliente, visando não só à conclusão vitoriosa do processo arbitral em favor deste último, mas principalmente à máxima redução das possibilidades de seu ex adverso encontrar material suficiente para alongar a disputa numa indesejada via judicial prorrogativa.

 

Pelos Árbitros e Tribunais Arbitrais, a seu turno, tais possibilidades devem ser encaradas de forma absolutamente imparcial, e sempre com a devida prudência, primando-se pela concordância das partes com a sua implementação, sem jamais perder de vista os “princípios do contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e de seu livre convencimento” (art. 21, parágrafo segundo, da Lei da Arbitragem).

 

Referências:

[1] Anotações práticas sobre a produção de provas na arbitragem. Revista Brasileira de Arbitragem, São Paulo, v.7, n. 25, jan – mar 2010; p. 11.

Colunista

Avalie o post!

Incrível
10
Legal
3
Amei
10
Hmm...
0
Hahaha
0
Guilherme Macedo
Advogado com 15 anos de experiência de foro e arbitragens. Formado em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Bacharel em Administração pela Academia da Força Aérea / Universidade da Cidade. Árbitro do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem - CBMA. Sócio Fundador do Escritório Guilherme Macedo Advogados. Anteriormente foi Sócio Sênior do Escritório H. B. Cavalcanti e Mazzillo Advogados. Foi também aviador da Força Aérea Brasileira. Fala português, inglês, espanhol e italiano.

    Você pode gostar...

    Leave a reply

    O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

    8 − 2 =

    Mais em Arbitragem